Agora que está para começar no Congresso a tramitação do novo arcabouço fiscal, tem início a contagem regressiva para a discussão de outras propostas do Governo. Como a da reforma tributária, que no passado recente já ameaçou uma ferramenta básica de educação, conhecimento, cidadania e mobilidade social: o livro.
Os livros estão imunes de impostos desde 1946 e há quase 20 anos estão sob proteção da imunidade tributária, que caso revista teria efeitos devastadores. Isso afetaria toda a cadeia de produção e de distribuição, encarecendo as obras para o leitor , além de reduzir a bibliodiversidade.
Em 2020 a Abrelivros, a Câmara Brasileira do Livro (CBL) e do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) atuaram em defesa da não tributação, diante da ameaça de taxação pelo PL 3887/2020, uma primeira etapa da reforma tributária proposta pelo governo anterior.
O projeto contemplava a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que atingiria os livros. Felizmente a proposta não avançou. Mas com a reforma tributária novamente em discussão, é difícil não pensar em riscos sobre o resultado das discussões no Congresso.
Os argumentos de 2020 continuam mais do que válidos para defender a imunidade do livro e o maior acesso às obras. E ficaram ainda mais relevantes por conta da pandemia, que resultou por exemplo em falências e pedidos de recuperação judicial de livrarias, reduzindo o acesso aos livros . Assim como a educação, que enfrentou dificuldades nunca antes vistas, em todos os seus setores, sejam eles operacionais, logísticos, tecnológicos e de formação.
O aumento dos preços dos livros agravaria ainda mais este quadro, principalmente no caso das famílias com menor renda, para as quais a participação do gasto com livros é maior. Segundo a pesquisa “Retratos da Leitura”, 27 milhões de brasileiros identificados nas classes C, D e E, são compradores de livros.
Neste contexto, o próprio Governo Federal seria atingido, por ser o maior comprador de livros do país. O Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), distribui anualmente mais de 130 milhões de livros a quase 30 milhões de estudantes de escolas públicas estaduais e municipais de todo o país.
O fim da imunidade tributária seria extremamente perverso também a médio e longo prazo. Teríamos impactos no desenvolvimento humano e, em particular, nos índices de aprendizagem, o que seria desastroso para o desenvolvimento do país.
Não é à toa que a não-tributação de livros é uma prática internacional, como as entidades do livro destacaram na Carta Aberta encaminhada aos candidatos e candidatas à presidência da República, antes do primeiro turno das eleições de 2022.
A imunidade do livro começou a ser conquistada há quase 80 anos, quando o deputado (e famoso escritor) Jorge Amado aprovou, na Constituinte de 1946, a proposta de isenção de impostos. E foi consolidada no primeiro Governo Lula, em 2004, quando as alíquotas do PIS e Cofins foram reduzidas a zero.
Representantes do Governo e do Congresso tem emitido sinais de que reconhecem a importância da manutenção da imunidade tributária do livro. Mas é da maior importância que o país receba um posicionamento público, tanto do Executivo quanto do Legislativo, pela não-tributação das obras, em benefício de toda a população brasileira.
Governantes e parlamentares estão diante da oportunidade de assegurar em definitivo a continuidade de todos os avanços que protegeram, até hoje, um bem fundamental para a democratização do acesso à cultura e à educação. Contribuindo, assim, para uma sociedade mais justa e com oportunidades para todos.
Ângelo Xavier
Presidente da Abrelivros