Não são apenas as editoras que programam investimentos e expansões. Redes de livrarias entusiasmadas com o aquecimento do mercado decorrente da retomada econômica estão reformulando suas operações e expandindo os pontos-de-venda. A Siciliano, maior rede de livrarias do País em número de lojas próprias, com 53 unidades (além de outras quatro em sistema de franquia), está promovendo uma reviravolta em seus negócios.
Até o mês que vem a empresa abandona definitivamente a venda de produtos como CDs, DVDs e artigos de papelaria. “Nosso foco será estritamente em livros. Não vamos nos dispersar mais“, diz o presidente da empresa Álvaro Silva, que assumiu o posto em janeiro.
Com esse novo foco, a Siciliano abandona produtos que lhe rendem 25% de faturamento. Mesmo assim, a rede mantém uma meta ambiciosa de crescimento de 10% em 2005. Outra mudança radical diz respeito à internet. A Siciliano ambiciona se transformar no principal site de venda de livros do País, com uma oferta de mais de 100 mil títulos. Em média, atualmente as lojas da rede oferecem entre 20 mil e 30 mil títulos. Para o novo site, que entra no ar no segundo semestre, a empresa está investindo pesado em logística.
“A idéia é trazermos de volta os chamados livros de fundo de catálogo que, por serem edições antigas, não são mais encontradas com facilidade nas livrarias comuns, mais focadas em lançamentos e novidades“, diz Silva. Ao todo, a Siciliano planeja investir R$ 3 milhões durante o ano de 2005. Pretende ainda abrir duas ou três lojas próprias e 15 franquias. O faturamento da empresa foi de R$ 182 milhões, dos quais 7% vieram da editora do grupo, hoje formada por quatro selos – ARX, ARX Jovem, Futura e Caramelo.
Outra empresa que pretende manter investimentos ambiciosos em 2005 é a Livraria Cultura. Durante anos, a Cultura resistiu à expansão, mantendo uma única loja na Avenida Paulista. A expansão começou em 2000 e agora chega à sua quinta filial, em Brasília – são dois endereços em São Paulo, um em Porto Alegre e outro no Recife. As lojas da Cultura são bastante peculiares, com mais de mil metros quadrados. Custam, em média, R$ 6 milhões cada uma. A sexta loja do grupo será inaugurada em São Paulo em 2006. “Nosso ritmo de expansão é lento porque não queremos descaracterizar as livrarias. Na verdade, as lojas são um espaço para quem gosta de livros, com muita atividade cultural“, explica Sérgio Herz, diretor da empresa.
Herz acredita que a empresa atingiu a maturidade para a expansão e agora tem uma “espinha dorsal“ formada, de onde pode se ramificar. “Livro é um negócio complicado. Se você comprar dois e não vender um, perdeu“, diz ele. Na avaliação de Herz, o mercado editorial vive um bom momento. Best sellers como os livros de Paulo Coelho e de Dan Brown são ótimas oportunidades para as livrarias. “Eles trazem leitores que não têm hábito de comprar livro“, diz. “Harry Potter, por exemplo, além de atrair um público novo, quebrou aquela idéia de que criança não lê livro grosso“.
O Brasil dos fenômenos editoriais
O Estado de São Paulo – Daniel Hessel Teich
Código da Vinci, Paulo Coelho e Harry Potter são as exceções em um País onde a média de leitura é de 1,8 livro por ano
O editor Marcos Pereira, um dos donos da editora Sextante, tem motivos de sobra para comemorar o sucesso de seu negócio. O livro O Código da Vinci, publicado pela editora, acaba de completar um ano de lançamento com uma performance inacreditável: vendeu 750 mil exemplares. Há três semanas, o editor Paulo Rocco, da editora que leva seu sobrenome, preparou uma estréia espetacular para O Zahir, o último livro de Paulo Coelho, com uma primeira edição com 320 mil cópias, uma das maiores de que se tem notícia no Brasil. Na ocasião, Coelho acabou estampando as capas das três principais revistas semanais do País, um fenômeno inédito para um lançamento de livro.
Em um mercado como o brasileiro, onde a tiragem média de um novo título é de 3 mil exemplares, os feitos da Sextante e da Rocco são raridade. O faturamento de mais da metade das editoras brasileiras não chega a R$ 1 milhão por ano e apenas 5% ultrapassam os R$ 50 milhões. O brasileiro lê pouco e o governo é o grande comprador de livros do País. Em 2003, último ano a ser contabilizado pela Câmara Brasileira do Livro, o governo comprou 43% do total de exemplares vendidos.
Apesar desse retrato pouco alentador, a indústria do livro está otimista. Um levantamento do Ministério da Cultura aponta que as editoras pretendem investir R$ 239 milhões em 2005, um valor 48% maior do que o registrado no ano passado.
Boa parte desse otimismo é resultado da desoneração fiscal dos livros promovida pelo governo federal em dezembro. Com isso, as editoras deixaram de recolher impostos que variam entre 3,65% e 9,25%. “Isso significa uma injeção de cerca de R$ 15 milhões por mês“, explica Galeno Amorim, coordenador do Plano Nacional do Livro e Leitura do Ministério da Cultura.
Marcos Pereira, da Sextante, começou o ano investindo pesado em lançamentos que seguem a esteira do sucesso de O Código da Vinci, uma história de mistério que mistura personagens como Jesus Cristo, Maria Madalena e Leonardo da Vinci. A editora comprou os direitos de quatro livros do escritor Dan Brown, autor do best seller. Anjos e Demônios, um deles, já vendeu 240 mil exemplares. O outro, Fortaleza Digital, lançado há duas semanas, já esgotou a primeira edição de 80 mil exemplares e está em fase de reimpressão. “Erramos nas contas“, brinca Marcos, que é neto do editor José Olympio, fundador da editora do mesmo nome. Na semana passada, O Código da Vinci ganhou uma edição ilustrada, que sairá por R$ 59, R$ 25 a mais que o livro original. A tiragem é de 60 mil exemplares.
A Editora Rocco também prevê mais fartura para 2005. Além de Paulo Coelho, contará com trunfos como o novo Harry Potter, que terá uma tiragem tão opulenta quanto à de O Zahir e doses colossais de marketing. “Pensa-se que só os best sellers contam com estrutura de marketing. Na verdade, todos os livros têm um planejamento de marketing por trás“, explica Rocco. “Aquele romantismo dos velhos tempos, onde se imprimia um livro, mandava para as lojas e pronto, não tem mais espaço no mercado editorial de hoje.“
O mercado brasileiro, mesmo com todos seus contrastes e problemas, tem despertado a cobiça de editoras estrangeiras. A espanhola Planeta chegou em 2003. Ainda é pequena, mas planeja estar entre as primeiras do ranking entre 2008 e 2009. Agressividade é que não falta aos espanhóis. Fisgou da concorrência os escritores Fernando Morais, Zuenir Ventura e Paulo Lins. Em maio lança uma trilogia escrita pelo ídolo pop Bob Dylan. “O Brasil é um mercado com dificuldades, onde as editoras dão descontos enormes aos livreiros, as tiragens são reduzidas, mas às vezes acontecem surpresas que superam tudo isso“, diz César Gonzalez de Kehrig, diretor da Planeta no Brasil. As “surpresas“ são livros com edições que quebram a barreira dos 100 mil exemplares – como As vidas de Chico Xavier, primeiro título da Planeta a alcançar esse status.
“Isso é um fenômeno raro, mesmo em países de grande tradição em livros como Uruguai, Chile e Venezuela. Esses mercados encolhem na comparação com o Brasil“, diz. Por essas e outras, a Planeta tem planos ambiciosos. Até agora investiu US$ 7 milhões no País mas não descarta aumentar muitas vezes esse valor com a compra de concorrentes, como já fez na Espanha e em vários países.
2,3
bilhões de reais foi o faturamento do setor de livros no Brasil em 2003, último dado disponível
225
milhões de exemplares foram vendidos no País em 2003. A média de leitura é de 1,8 livro por habitante/ano
52%
das editoras brasileiras têm um faturamento inferior a R$ 1 milhão por ano
74%
dos editores acham que 2005 será melhor que 2004. A expectativa é de lançamento de 16 mil novos títulos este ano