A Justiça de São Paulo mandou nesta segunda-feira (04/09) a Secretaria estadual de Educação do governo Tarcísio de Freitas(Republicanos) suspender a liberação do material didático digital após ser constatado graves erros no conteúdo.
Na liminar, a juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, estabelece o prazo de 48h para que os slides com erros de informação, que fazem parte do material 100% digital, sejam retirados do ar “até que sejam corretamente revisados, e sigam os padrões estabelecidos pelo Ministério da Educação”.
Ela ainda estabeleceu uma multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento da medida. O g1 entrou em contato com a Secretaria da Educação e aguarda retorno.
A decisão atende a uma ação popular proposta pela deputada professora Bebel (PT).
Na semana passada, professores da rede estadual de ensino afirmaram que o material didático digital feito pela Secretaria e enviado a docentes e estudantes do estado de São Paulo para ser aplicado nas salas de aula no ensino fundamental contém erros grotescos em diferentes disciplinas, entre elas história, biologia e matemática.
Em nota, a pasta, coordenada por Renato Feder, informou ao g1 que afastou os servidores responsáveis pelos graves erros didáticos no material digital produzido pela pasta e que o conteúdo, que é editável, foi atualizado e retificado.
O caso foi revelado pelo UOL e confirmado pelo g1, que também teve acesso a parte dos erros apontados pelos professores.
Um deles estava no conteúdo de história para estudantes do 9º ano do ensino fundamental, nos slides sobre o governo Jânio Quadros para o terceiro bimestre.
O slide 19 da aula 8 afirmava que a cidade de São Paulo tem litoral (veja print acima).
“A proibição do uso de biquínis foi adotada por Jânio Quadros em 1961, quando ele era prefeito de São Paulo. Ele emitiu um decreto vetando o uso de biquínis nas praias da cidade. A justificativa de Quadros era que o traje de banho seria uma afronta à moral e aos bons costumes. Esse impedimento também causou grande repercussão na época e gerou protestos de mulheres”, diz o texto.
Jânio realmente proibiu o biquíni, mas a medida foi tomada quando ele era presidente, com foco nas praias do país, não da capital paulista.
Outro erro encontrado pelos docentes foi na aula 25 para estudantes do 8º ano sobre “os abolicionistas”. Na parte da Lei Áurea, o slide afirmava ter sido Dom Pedro 2º e não a filha, Princesa Isabel, que assinou a Lei Áurea em 1888 para o fim da escravidão no Brasil.
Na aula 5 de Ciências para o 7º ano do ensino fundamental, dedicada ao assunto “doenças de veiculação hídrica”, mais erros foram encontrados pelos professores.
No slide 9, constava que a água pode transmitir Parkinson, Alzheimer e depressão caso esteja contaminada por mercúrio, agrotóxicos, remédios e produtos químicos em geral.
Já na disciplina de matemática, na aula 7, para o 6° ano do ensino fundamental, foi encontrado erro em uma conta básica de divisão. Em vez de 36 dividido por 9 ser igual a 4, o resultado apontava 6.
“Tem vários erros mesmo no material e isso é bem ruim. A gente pede para os professores falarem que está errado e orientar [o aluno] para o correto. E estamos sempre comunicando para que eles possam ser atualizados”, afirmou um coordenador de uma escola estadual, que prefere não se identificar.
Em outro conteúdo, da primeira série do ensino médio, sobre a política e a música brasileira nos anos da ditatura militar, a música “É Proibido Proibir”, de Caetano Veloso, aparece com uma foto e o nome de outro cantor da época, Geraldo Vandré.
Em física, os alunos do ensino médio apontam outro erro quando o assunto era o espectro solar: o slide falava uma descoberta do físico e astrônomo francês Jean Foucault em 1985, mas ele morreu em 1868.
Ainda conforme a secretaria, “a coordenadoria pedagógica da instituição vai reforçar a equipe de revisão para que haja aprimoramentos constantes nos recursos didáticos, sempre em total harmonia com o Currículo Paulista”.
Secretaria da Educação e o PNLD
A Secretaria da Educação do estado tem se envolvido em polêmicas envolvendo material didático desde a primeira semana de agosto, quando a rede estadual paulista retomou as aulas para o segundo semestre letivo.
A pasta anunciou que não iria mais aderir ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) para os anos finais do ensino fundamental (do sexto ao nono ano) e ensino médio.
O PNLD é o programa do governo federal por meio do qual as escolas e redes de ensino podem escolher livros didáticos de literatura para uso em sala de aula. Todos os anos, a escolha costuma ocorrer em agosto, para que a entrega dos livros seja feita a tempo para o ano letivo seguinte.
Para as séries iniciais (primeiro a quinto ano), e para os livros de literatura, a Seduc informou que nada mudaria, e que seguiria participando do programa federal.
Como substituição aos livros do PNLD nos anos finais do fundamental, a Seduc disse que adotaria, a partir de 2024, um material didático 100% digital, com slides produzidos pela própria secretaria, parte do Currículo Paulista.
Mas, depois de críticas de especialistas e da comunidade escolar sobre a eficácia da metodologia e sobre as limitações tecnológicas, o governo paulista voltou atrás e disse que imprimirá o material do Currículo Paulista.
A recusa do PNLD, porém, estava mantida. Em coletiva de imprensa, o secretário Renato Feder deu uma série de justificativas para a escolha, entre elas o dado de que o PNLD era pouco usado pelos alunos, apesar de não ter mostrado a fonte original da pesquisa.
Outro argumento usado por ele foi o de que os livros do governo federal são entregues aos estudantes por meio de um empréstimo e precisam ser devolvidos ao fim do ano letivo. Por isso, os usuários não podem fazer anotações no material.
Contudo, a Justiça determinou, na noite do dia 16 de agosto, que a Secretaria da Educação do estado de São Paulo voltasse a aderir ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) em 2024.
Após a decisão, a pasta divulgou uma nota afirmando que retornaria ao PNLD sem, no entanto, mencionar a decisão judicial.
Publicado por G1 em 04/09/2023.