Governo exige que crianças entrem no 1º ano com 6 anos

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Amanda Gilius tem apenas 5 anos de idade, mas já é quase uma veterana na escolinha onde estuda. Desde que tinha 1 ano e 6 meses ela frequenta o colégio Recanto dos Sabidinhos, em São Paulo. Amanda é uma menina esperta e sempre teve bom desempenho nas atividades propostas pelos educadores. Mas no começo deste ano ela teve de dar um passo atrás. Amanda foi reprovada. Não por culpa de seu rendimento ou qualquer coisa parecida. Sua reprovação é consequência de uma lei federal, que determina a idade mínima de 6 anos para o ingresso de alunos no 1º ano do ensino fundamental. Devido à reprovação, Amanda permaneceu na mesma série, o jardim. Em 2009, ela está vendo o mesmo conteúdo que aprendeu no ano passado. Se Amanda continuasse seus estudos normalmente, não poderia entrar no 1º ano, a antiga pré-escola. A decisão pegou Neide Gilius, mãe de Amanda, de surpresa. “Quando fui até a escola, me deram a opção de reprová-la neste ano ou no próximo. Preferi que fosse agora, que ela ainda é pequena”, diz Neide. Para complicar, reprovar as crianças nessa fase pode ter um impacto emocional negativo. “Quando o aluno fica na mesma série e vê os amigos avançar, pode se sentir deslocado, inferior e incapaz”, diz Fernanda Crivelli, coordenadora do Recanto dos Sabidinhos. “Isso pode comprometer seu desenvolvimento escolar.” Ela recomenda que, nesses casos, os pais troquem o filho de escola.  
 
A confusão que reprovou Amanda aconteceu porque a lei, de 2006, só começou a ser aplicada integralmente neste ano. As escolas tinham quatro anos para se adequar. Mas muitas deixaram para a última hora, já que o prazo para todas as crianças estarem com a idade mínima correta vai expirar em janeiro de 2010. Segundo um levantamento feito pelo Ministério da Educação (MEC) no ano passado, 84,4% dos 4.696 municípios brasileiros já haviam aderido à nova lei. Mas em muitos deles as crianças ainda estavam com idade não compatível com a série. A expectativa é que surjam mais problemas como o de Amanda até o fim deste ano, quando os pais começarem a planejar as próximas matrículas. O irônico é que a lei foi criada para antecipar a entrada das crianças na escola. Com a mudança, o ensino fundamental passou de oito para nove anos de duração. Antes, ele começava na 1ª série, direto no momento da alfabetização. Agora, incorporou a pré-escola, que virou o 1º ano. Esse ganho foi importante porque é o período em que as crianças desenvolvem as habilidades motoras e a maturidade emocional para o resto do ciclo escolar.  
 
Para Quézia Bombonatto, presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp), essa é a fase mais importante da vida estudantil. É aí que os alunos aprendem a segurar o lápis e a escrever da esquerda para a direita. As famílias de classe média e alta já costumavam colocar os filhos na escola com antecedência. Agora, todas as crianças terão direito a essa fase, no 1º ano. Só que o MEC aproveitou a mesma mudança na lei para corrigir outro problema: a presença de crianças precocemente matriculadas nas escolas nas classes de alfabetização. Na primeira fase da vida escolar é necessário que o aluno se sinta estimulado e confiante, diz Lisete Areralo, doutora em pedagogia pela USP. A criança deve ter condições de acompanhar o grupo. Assim ela se sentirá parte dele. Por isso, manter uma criança adiantada na escola pode trazer prejuízos para sua formação. A intenção foi boa. Mas a aplicação da mudança foi precária. Não há um órgão com atribuição de fiscalizar. E cada município ou Estado podem fazer ajustes na lei. Nas escolas da prefeitura do Rio de Janeiro, podem ingressar no 1º ano as crianças que completarem 6 anos até o dia 30 de junho. Já em São Gonçalo, município da região metropolitana do Rio, o prazo é até o fim de abril. Nessa falta de critérios únicos, as escolas se embolaram. E não se prepararam para a adequação à lei. A carioca Daniele Coelho, mãe de Vinicius, de 5 anos, diz que a própria escola adiantou o filho, no início deste ano, ignorando a mudança na lei. O menino deverá entrar no 1º ano em janeiro e só vai comemorar o sexto aniversário depois, em julho. Ela julga que o filho tem plenas condições de acompanhar a turma, mesmo sendo um pouco mais novo que os colegas. No começo de 2009, ela mudou seu filho de escola. No antigo colégio, Vinicius cursava o jardim I. Na mudança, porém, ele passou por uma avaliação, feita pela própria instituição, e avançou para o jardim III. Daniele concordou com a decisão. “Sei que não é bom adiantar uma criança, mas com Vinicius é diferente”, afirma Daniele. “Eu nunca quis ultrapassar o limite dele. Ele acompanha a turma superbem.”  
 
Na prática, a maioria das escolas particulares não vai ter problemas com alunos fora da idade certa, por falta de fiscalização. Por isso, Érica Adorno, mãe do pequeno Henrique, de 5 anos, diz que não está preocupada. Atualmente, o menino está no jardim III. Em 2010, Érica espera que Henrique vá para o 1º ano, mesmo sem ter 6 anos completos. Henrique faz aniversário no meio do mês de março, mas parece que isso não mudará seus rumos na escola. Para Érica, os alunos de escolas particulares não serão afetados pelas mudanças na lei. “Em minha opinião, essa foi só uma atitude política, o governo não dá conta da demanda”, afirma Érica. “Para quem tem condições de pagar pelo estudo dos filhos as coisas continuam as mesmas.” Ela deve ter razão, embora isso não sirva de consolo para crianças como Amanda.  
 
O que muda com a nova lei – A lei que amplia o ensino fundamental, de oito para nove anos, vem causando confusão entre pais e escolas. Não havia uma idade mínima para entrar na antiga 1a série. Agora a criança deve ter no mínimo 6 anos de idade completos  
 
COMO ERA – PRÉ-ESCOLA É o momento do desenvolvimento emocional das crianças. Não era obrigatória no currículo escolar e não estabelecia idade mínima. 1ª SÉRIE Quando começa a alfabetização. Era obrigatória no currículo escolar e não estabelecia uma idade mínima para o ingresso dos alunos  
 
COMO FICOU – 1º ANO Cumpre a função da pré-escola. Só que é obrigatória. A criança só pode entrar com 6 anos completos no primeiro dia de aula (se não houver exceção no município). 2º ANO É equivalente à antiga 1ª série. Mas agora, para se matricular, a criança, com 7 anos completos, precisa ter feito o 1º ano  

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