Entrada das bibliotecas no PNLD é celebrada, mas mecanismos ainda não estão claros

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Desde sexta-feira (17), está em vigor um decreto que inclui as bibliotecas públicas e comunitárias no Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD). Embora a inclusão tenha sido celebrada por instituições e profissionais do livro, os mecanismos de operação e mesmo os tipos de livros que serão adquiridos ainda não estão tão claros.

A diretora-executiva da Abrelivros, Renata Müller, explica que o decreto abre possibilidades para os diversos editais do Programa, incluindo o PNLD Literário – que deve ser o foco das requisições das bibliotecas.

“O que a gente acha importante é que essa nova forma de aquisição venha a ser um complemento, e não uma substituição da forma como as bibliotecas hoje são atendidas”, comenta. “Porque a biblioteca não é destinada apenas para o público matriculado na educação básica, mas tem um público mais amplo, mais diverso”.

Embora o PNLD também adquira livros que podem ser lidos com proveito por pessoas de todas as idades, o Programa é voltado para aquisição e fornecimento de materiais voltados para a educação básica.

Para as editoras, há uma expectativa de aumento na quantidade de alguns livros envolvidos no PNLD, mas ainda não é possível prever impactos, tampouco se as mudanças vão representar alterações significativas no orçamento do Programa – a depender, por exemplo, da quantidade de obras que vão ser acrescentadas nos pedidos, do cálculo que relaciona tiragens maiores e menores preços, entre outros fatores.

“Uma possibilidade no futuro é ser criado um PNLD Bibliotecas, mais adequado e aderente às realidades e necessidades das bibliotecas, ouvindo melhor os profissionais e tudo o mais”, especula Renata. “Vemos um movimento positivo de sinalização, junto com outras regulamentações de políticas públicas, que são bons sinais. Vamos esperar que a execução seja boa também e que ouça a ponta, para atender bem ao público leitor”.

Para o presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia 6ª Região (CRB-6) – Minas Gerais e Espírito Santo –, Álamo Chaves, é importante garantir a concretização dos artigos do Decreto n.º 12.021 pelos entes públicos, “uma vez que, no Brasil, há regramentos que são respeitados e outros que não são respeitados”, comenta.

Ele aponta que os novos recursos do Programa podem influenciar nas condições de trabalho e até de existência das bibliotecas. “As bibliotecas públicas são o principal equipamento cultural no Brasil”, diz Chaves ao PublishNews. “Entretanto, elas sofrem com o descaso das prefeituras e dos governos estaduais em todo o país. A maior parte delas não possui orçamento para compra de materiais, aquisição de mobiliários, investimento em tecnologia, renovação de acervos ou contratação de pessoal.

Muitas vezes, a própria estrutura física da biblioteca pública é a pior possível, como ocorre na cidade mineira de Três Corações, terra natal do jogador Pelé, na qual a biblioteca pública municipal funciona(va) na garagem de um posto de saúde, em condições insalubres. Na Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais, localizada ao lado do Palácio da Liberdade, então local de trabalho do governador, na área mais nobre de Belo Horizonte, faltam equipamentos que viabilizem o correto funcionamento do local, linhas de telefone já foram cortadas por falta de pagamento, e, não bastasse todo o descaso do governo estadual, o funcionamento da biblioteca estende-se somente até às 16 horas, pois não há funcionários para atender leitores e usuários após este horário”, explica.

Nesse sentido, qualquer mínimo investimento toma proporções significativas, opina. “Diante da falta de recursos para compra de livros e renovação de acervo, o decreto é muito bem-vindo”, afirma.

A expectativa de atualizar, ampliar e diversificar os acervos é também compartilhada pela presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia do Estado de São Paulo (CRB-8), Ana Cláudia Martins. “A inclusão das bibliotecas públicas e comunitárias no âmbito do PNLD proporciona benefícios para todos os usuários, pois diversifica, atualiza e amplia o acervo literário das bibliotecas, democratizando o acesso e estimulando o hábito da leitura. As bibliotecas escolares, públicas e comunitárias terão autonomia para estabelecer suas políticas de uso e cessão temporária de obras e, embora distintas, as políticas públicas vão dialogar com as diretrizes e regras do PNLD”, afirma.

Para a vice-presidente do CRB-8, Regina Fazioli, o decreto também vai contribuir em diversos aspectos. “Entre tantas outras medidas, posso salientar a expansão do acesso a obras literárias, o aumento do acervo das bibliotecas, o fortalecimento da rede de bibliotecas, e a promoção da inclusão social e educacional. Além disso, incentiva a leitura, apoia a educação continuada, contribui para o desenvolvimento cultural e ajuda a reduzir desigualdades no acesso à informação e à educação”, comenta.

O diretor-executivo da SP Leituras – organização social que administra o Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas de São Paulo (Siseb) –, Pierre André Ruprecht, concorda que a inclusão de bibliotecas no PNLD é um bom sinal.

“Há bastante tempo já o campo das bibliotecas de acesso público vinha defendendo esta ideia: afinal, a construção de uma nação leitora exige prioridade e investimento constante nas escolas, mas também nas bibliotecas públicas. Trata-se do equipamento público de cultura mais disseminado pelo país, próximo da população e em especial da população mais vulnerável, e deveria funcionar como o grande centro de informação e formação continuada dos municípios”, avalia.

“Uma das questões chave é que o mecanismo de seleção dos materiais possa de alguma maneira contemplar também a visão das bibliotecas públicas e comunitárias, pois se é evidente que elas têm compromissos com a população em idade escolar, é menos evidente mas é fundamental seu compromisso com toda a cidadania, desde pais e crianças na primeira infância, até adultos e idosos e passando naturalmente pelos jovens”, diz Ruprecht. “Vamos acompanhar com muito interesse a implantação da medida. Sabemos que os desafios são grandes para que tenhamos no país uma verdadeira rede de bibliotecas públicas que funcionem como plataformas de conhecimento e cultura para todas as pessoas, e como ponto de acesso focado no letramento e na informação, incluindo o letramento digital.”

A possibilidade de maior atualização do acervo também é destacada pelo diretor da Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo, Jurandy Valença. “Embora a Biblioteca Mário de Andrade já tenha em sua política de desenvolvimento de coleções a bibliodiversidade como foco, a expansão do PNLD para as bibliotecas públicas vai ampliar ainda mais o acesso à leitura e aproximar a comunidade local da nossa instituição, reforçando essa atualização do acervo que já vem acontecendo no âmbito municipal”, afirma.

O que diz o Decreto nº 12.021, de 16 de maio de 2024:
• O PNLD poderá atender bibliotecas públicas integrantes da administração direta e indireta dos entes federativos e bibliotecas comunitárias constantes dos cadastros oficiais do Ministério da Cultura, na forma estabelecida em ato conjunto dos Ministros de Estado da Educação e da Cultura;
• As bibliotecas receberão os livros literários com base nas escolhas das escolas da rede de ensino do respectivo ente federativo e de acordo com critérios técnicos estabelecidos em Resolução do FNDE;
• A distribuição e a disponibilização de recursos educacionais para as bibliotecas ficam condicionadas à adesão ao PNLD do ente federativo no qual a biblioteca se encontra situada e à disponibilidade orçamentária;
• As bibliotecas escolares, públicas e comunitárias adotarão livremente suas políticas de uso e cessão temporária de obras, desde que em consonância com as diretrizes e regras do PNLD.
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