Elite ocupa até 1/4 das vagas na rede pública

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Estudo avaliou 26 mil estudantes de SP e SC; na 8ª série, número de alunos das classes A e B supera o das classes D e E  
 
 
A idéia de que na escola pública só estudam pobres é desmentida por uma pesquisa do projeto Gestão para o Sucesso Escolar, realizada com 26 mil alunos de 200 escolas públicas dos Estados de São Paulo e Santa Catarina. O estudo -de iniciativa dos institutos Gestão Educacional e Protagonistés- mostra que, na 8ª série dessas escolas, a presença de estudantes das classes A e B, de maior poder de consumo, é maior do que a das classes D e E. Segundo a pesquisa, 26% dos estudantes da 8ª série fazem parte das classes A e B, enquanto 22% são das classes D e E. Na 4ª série, a proporção de alunos da elite também é significativa (20%), mas inferior à de mais pobres (29%). Para chegar a essa conclusão, a pesquisa usou o Critério Brasil, padrão usado pelo mercado publicitário para avaliar o poder de consumo da população. O critério não leva em conta apenas a renda familiar, mas também a posse de bens e outras características. Em ambas as séries, a pesquisa mostra que a maioria dos alunos dessas escolas é da classe C (50% na 4ª série e 52% na 8ª série).  
Para Rose Neubauer, coordenadora da pesquisa e ex-secretária estadual da Educação de São Paulo, a maior proporção de alunos das classes A e B na 8ª série revela um problema do sistema de ensino: estudantes mais pobres abandonam mais a escola antes do último ano do ensino fundamental. O critério para a escolha das escolas no projeto Gestão para o Sucesso Escolar foi apresentar indicadores que precisam melhorar e a vontade de mudar dos diretores. “Não é nenhuma surpresa constatar que uma parte da elite está na escola pública porque os dados do Censo Escolar do Ministério da Educação mostram que 90% dos estudantes brasileiros estudam na rede pública no ensino fundamental“, disse Neubauer.  
 
Francisco Poli, secretário da Udemo (sindicato que representa diretores de São Paulo), lembra também que a presença da elite em escolas públicas é muito maior nas cidades do interior do que na capital de São Paulo. “Nas cidades menores, às vezes nem tem escola particular no ensino fundamental. Uma escola pública de uma cidade do interior atende a uma clientela bem diferente de uma escola pública da zona leste de São Paulo“, disse. A comparação das notas dos alunos por classes mostra que os estudantes mais ricos têm desempenho melhor do que os mais pobres.  
 
A pesquisa indica, no entanto, que o efeito da repetência é o mesmo em todas as classes. Alunos da classe A que não repetiram tiveram média de acerto de 67% das questões em uma prova de português na 4ª série. Entre os estudantes da mesma classe que estavam repetindo a 4ª série, a média de acertos caiu para 52%. Essa diferença a favor dos que estão fazendo a 4ª série pela primeira vez acontece em todas as classes. Na classe E, a média de acertos dos não-repetentes foi de 55%, enquanto entre os repetentes a proporção caiu para 47%.  
 
Na escola municipal Geni Leite da Silva, de Birigüi (SP), que faz parte do projeto Gestão para o Sucesso Escolar, a diretora Áurea Serra afirma que os professores têm que lidar com alunos de todas as classes. “Os problemas que cada aluno apresenta e a solução para cada caso variam de acordo com a classe. Às vezes, a escola pode indicar para pais da classe A que o filho procure um terapeuta ou fonoaudiólogo por conta própria. No caso de alunos mais pobres, a escola precisa encaminhá-los para uma instituição pública.“ 
 
 
Escola pública boa deve começar em casa  
 
Pesquisas mostram que participação, interesse e estímulo por parte das família melhoram desempenho dos alunos  
 
A receita para uma boa escola pública é simples e dá resultados. Seus principais ingredientes são a participação dos pais, o interesse da família pela vida escolar do aluno, o estímulo à leitura e o hábito de fazer e corrigir o dever de casa. Junta-se a isso a vontade do diretor em colocar em prática essas lições e, como resultado, há uma melhoria no desempenho. O efeito positivo das práticas acima vem sendo comprovado cientificamente.  
 
Pesquisa com 26 mil alunos de 200 escolas públicas de São Paulo e Santa Catarina que fazem parte do projeto Gestão para o Sucesso Escolar (voltado para diretores) mostra que os ingredientes citados melhoram o desempenho dos estudantes. Para chegar a essa conclusão, foi feito um cruzamento da nota de alunos de 4ª e 8ª série em provas de português e matemática com respostas dadas por eles a um questionário socioeconômico. A pesquisa mostrou que alunos da 4ª série que afirmaram que os pais tinham o costume de perguntar se eles estavam indo bem na escola tiveram média de acertos de 62% na prova de português. Entre os estudantes que disseram que os pais quase nunca faziam essa pergunta, a média cai para 47%. O resultado foi parecido entre filhos de pais que costumam participar de reuniões da escola. Nesse grupo, a média de acertos foi de 62%. Se os pais quase nunca vão às reuniões, a porcentagem cai para 48%.  
 
Para Rose Neubauer, diretora-presidente do Instituto Protagonistés e coordenadora da pesquisa, ela mostra que mesmo pais com pouca escolaridade podem ajudar os filhos a ter boas notas se demonstram interesse pela vida escolar da criança e participam das atividades do colégio. “Se o pai estimula o filho a não faltar e ter boas notas, faz muita diferença entre as crianças da 4ª série.“  
 
Um estudo divulgado em julho pelo Inep, do Ministério da Educação, a partir de dados do Saeb (exame que avalia a qualidade da educação), chegou a conclusão idêntica: alunos cujos pais se preocupam com o que acontece na escola e que cobram os deveres de casa têm médias maiores.  
 
A pesquisa nas escolas de São Paulo e Santa Catarina mostra que o hábito de fazer dever de casa é uma das variáveis que mais têm impacto positivo. Se o aluno tem o hábito de fazer dever e os professores cobram dele que o faça, a média de acertos é de 63% em português na 4ª série. Se o aluno faz pouca lição de casa, a média cai para 44%; quando os professores não cobram, para 43%.  
 
Para Neubauer, pesquisas que analisam os fatores de sucesso do aluno dão um instrumento para as escolas melhorarem. Para Francisco Poli, secretário da Udemo (sindicato dos diretores em São Paulo), os resultados da pesquisa mostram que a escola precisa trabalhar não só com o aluno mas também com os pais e trazê-los para o ambiente escolar. Ele diz também que é importante que a escola esteja preparada e equipada para oferecer aos alunos mais carentes o que eles não têm em casa: “A escola não substitui a família, mas pode ajudar se os mais carentes tiverem aulas de inglês, informática ou passarem mais tempo nela“. (Antônio Gois) 
 
 
Estudo revela alto interesse dos pais
 
 
A pesquisa feita entre as escolas que participam do curso de Gestão para o Sucesso Escolar mostra ainda que os pais não são tão omissos em relação à educação dos filhos como muitos diretores e professores reclamam. A partir da resposta dos alunos, o estudo indica que 73,6% dos pais costumam perguntar sempre ou quase sempre se os filhos estão indo bem na escola. A porcentagem de familiares que, segundo a resposta dos alunos, nunca ou quase nunca fazem essa pergunta é de apenas 3,2%.  
 
Outro dado que chama a atenção na pesquisa é a razão para o sucesso na escola apontada pelos estudantes. A maioria (57,9%) afirmou que a razão para o sucesso é o próprio esforço. A segunda resposta mais citada (21,2%) foi a ajuda dos professores. Para 15,9%, a razão para o bom desempenho é a facilidade de aprender. A pesquisa mostra que alunos que disseram ter facilidade para aprender foram os que tiveram melhor desempenho. Indica também que os estudantes que auto-avaliaram sua proficiência na leitura como excelente tiveram as melhores notas.  
 
Para Rose Neubauer, o dado indica que a escola precisa saber trabalhar com a auto-estima do aluno. A imagem do sucesso ou fracasso projetada no estudante é, segundo ela, a principal explicação para alunos negros terem tido, em todas as classes sociais, desempenho inferior ao de brancos. “É a famosa profecia que se auto-realiza. Se o professor já acha que determinado aluno tem problema de aprendizado, gera uma expectativa de desempenho que a criança percebe“, diz Neubauer. 

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