Correios levam livros a 37 milhões de alunos de escolas públicas

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Quando as aulas do ano letivo de 2009 começarem, em fevereiro, todos os alunos de escola pública do País – 37 milhões de crianças e adolescentes – receberão um kit de livros das mais diversas matérias para usar durante as aulas. Esses alunos estão espalhadas pelos lugares mais diversos do Brasil: de centros urbanos a comunidades ribeirinhas. No total, serão atendidas 142 mil escolas em mais de 5.500 municípios de Norte a Sul do País. 
 
Por trás disso, que se repete a cada ano e é considerado um caso exemplar de política pública no País, e causa admiração pelo mundo afora, há uma operação logística complexa. Afinal, planejar a distribuição de qualquer produto ou serviço num país continental como o Brasil não é fácil em nenhum setor da economia. Quando se trata, então, da distribuição de livros didáticos, a situação tende a ficar ainda mais complicada. Caminhões e vans não são suficientes para se chegar a todos os destinos necessários. Às vezes, é preciso traçar rotas com aviões, balsas e até carros com tração quatro por quatro para alcançar todas as cidades. 
 
José Carlos de Oliveira, analista da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafo (ECT), explica que esta é a maior operação logística da companhia. “É a que demanda o maior investimento em menos tempo”, afirma. A estatal entrega, escola a escola, todos os livros adquiridos pelo governo desde 1994. Nos últimos três anos, enviou nada menos do que 290 milhões de exemplares. 
 
O processo recomeçou em setembro deste ano. Até fevereiro de 2009, os Correios serão responsáveis por levar 103 milhões de exemplares de livros didáticos a todas as escolas do País. São 70 mil toneladas de carga e 3.500 viagens de carreta – além de outros tipos de transporte – para realizar a distribuição. Segundo Oliveira, os Correios têm uma estrutura logística dedicada somente ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), braço do Ministério da Educação para as compras centralizadas das obras diretamente das editoras. 
 
O programa governamental de aquisição de livros começou em 1929. Porém, só nos anos 90 tornou-se sistemático tal como é hoje. O FNDE coordena a escolha dos títulos didáticos, negocia a compra junto às editoras e contrata os Correios para a distribuição. A negociação das empresas com o governo é dura. Em média, o governo paga R$ 0,34 por caderno tipográfico (o equivalente a 16 páginas). “Mas esse pagamento varia de R$ 0,30 a R$ 0,50, de acordo com a tiragem da editora”, explica Rafael Torino, diretor de Ações Educacionais do FNDE. Um livro de 10 cadernos tipográficos, por exemplo, sai por R$ 3,40. Um valor que pode chegar, às vezes, a ser dez vezes menor do que o preço do mesmo título nas livrarias.  
 
“O governo brasileiro é um dos maiores compradores de livros do mundo”, afirma o presidente do FNDE, Daniel Balaban. Tanto é verdade que o FNDE costuma abocanhar uma parcela significativa de toda a produção editorial brasileira. No ano passado, por exemplo, segundo a pesquisa sobre o desempenho do setor editorial que acaba de ser anunciada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), da Universidade de São Paulo (USP), o Estado adquiriu nada menos do que 126 milhões de exemplares. No ano, a produção editorial foi de 351 milhões, segundo dados do estudo, que foi encomendada pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) e o Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel). Essa proporção varia de acordo com o ano de aquisição, já que a compra do Estado é dividida em um ciclo trienal que atende, a cada ano, um dos três níveis da educação: primeiro ao quinto ano do ensino fundamental, sexto ao nono ano do ensino fundamental e o ensino médio. 
 
O governo investe, em média, R$ 900 milhões por ano para suprir a demanda das escolas públicas, do primeiro ano do ensino fundamental até o último do ensino médio, além de obras literárias para as bibliotecas das escolas atendidas (um programa recente, que passou a fazer parte das compras do governo, de forma permanente, a partir de 2005). 
 
O caminho percorrido por esses livros até chegarem às mãos das crianças, no entanto, é longo. Começa, em média, dois anos antes. O primeiro passo é dado pelo FNDE, que publica um edital em janeiro. Para os livros de 2009, por exemplo, o edital foi divulgado em janeiro de 2007. As editoras têm, então, um prazo de cerca de cinco meses para inscrever seus títulos. “Mas as editoras começam a trabalhar bem antes”, afirma Jorge Yunes, presidente da Associação Brasileira de Editores de Livros (Abrelivros), entidade que reúne as editoras de livros didáticos. Quando o edital do FNDE é divulgado, diz ele, as obras estão quase prontas e passam por uma espécie de adaptação para se encaixarem aos pedidos do governo, que são definidos em edital. 
 
Logo após a inscrição das obras no programa – que pode ser tanto o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) quanto o Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM), por exemplo –, os títulos passam por uma comissão de avaliação pedagógica do Ministério da Educação (MEC). O resultado dessa etapa, que demora entre oito e nove meses, é a criação de um guia com os livros didáticos aprovados. Em maio do ano seguinte, esse guia é enviado para as escolas públicas e usado pelos professores na hora de escolher qual livro eles preferem usar. As escolas podem optar por fazer suas escolhas pela internet ou por um formulário em papel, principalmente para os locais mais distantes do centro urbano. A demanda é processada em julho, explica Torino, do FNDE. “Em agosto, fazemos a negociação com cada editora”, diz o executivo. “Fechamos os contratos e geramos a demanda, por editora, para os Correios.”  
 
Para fazer todos esses livros chegarem a tempo nas escolas, o processo é extremamente organizado. Funcionários dos Correios começam a fazer parte do processo logístico já na gráfica, quando as editoras começam a imprimir os exemplares. Enquanto isso, é feita toda uma distribuição virtual: há um sistema que realiza toda essa logística no computador, para depois ser realizada fisicamente. 
 
A carga é retirada na editora e levada para centros de distribuição – existem 95 “centralizadoras” espalhadas pelo Brasil. Após chegar a esses lugares, a carga é redistribuída por municípios. Até então, tudo é feito por rodovias. Mas, apesar de essa ser a realidade predominante na hora de realizar a distribuição, há cidades brasileiras em que só se chega de barco ou de avião. Manaus é uma delas. Oliveira explica que a carga com destino à capital do Amazonas vai até Belém de caminhão. Após cinco a seis dias de estrada, os livros são colocados em uma balsa por mais dez dias. E continua pelo rio para chegar às comunidades ribeirinhas, algo que pode consumir 30 dias de transporte. 
 
Oliveira afirma que os Correios estão estudando algumas outras alternativas para essa complicada logística. É o caso, por exemplo, da cidade de Cruzeiro do Sul, no Acre, situada a cerca de 600 quilômetros de distância da capital, Rio Branco. “A carga sai de São Paulo e vai até Rio Branco. Porém, a rodovia que liga Rio Branco a Cruzeiro do Sul fica aberta só entre quatro e cinco meses do ano, por causa da temporada de chuvas. Porém, é justamente o período que não coincide com a nossa operação”, explica. Há duas opções: enviar os livros por avião ou subir o rio. “Durante esses anos, temos optado pelo avião. Mas, agora, estamos estudando a opção fluvial”, diz. 
 
As dificuldades são inúmeras, mas os alunos já se acostumaram: seus livros estarão na sala de aula quando começar o ano letivo. “O trabalho dos Correios é excepcional”, diz o presidente da Abrelivros. 

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