Brasil precisa vincular um percentual mínimo de recursos para a educação?

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on email

Recentemente voltou à tona a discussão sobre a desvinculação dos gastos com educação das receitas governamentais. O objetivo aqui é trazer alguns dados para discutir as motivações e limitações dessa vinculação orçamentária, que no caso da educação deve responder por 18% dos impostos arrecadados pela União e 25% por estados e municípios.

Acredito ser fundamental que a discussão sobre os gastos com educação parta de nosso contexto em relação ao mundo. Recentemente, foi divulgado o Censo 2022: o Brasil alcançou a taxa de 93% de sua população com mais de 15 anos alfabetizada. Partindo desse indicador básico, a habilidade para ler e escrever um bilhete simples, estamos pelo menos cem anos atrás dos norte-americanos, que em 1910 tinham taxa de 92,3%.

Se estamos muito atrás, deveríamos fazer algo para chegar junto. A imposição do mínimo de 25% é uma medida que visa recuperar o atraso na universalização e qualificação da educação no país. Educação é um investimento de longo prazo, portanto nem sempre prioridade na agenda pública, que responde aos ciclos eleitorais. Ter a imposição de um mínimo é uma forma de buscar o progresso na área ao longo de gerações.

Um problema com qualquer tipo de vinculação orçamentária é o engessamento que pode ocorrer. Como a Fazenda não consegue prever exatamente o valor que será arrecadado no período, é comum chegar ao final do ano e a Secretaria de Fazenda precisar ligar para a Educação: “Arrecadamos mais que o previsto e você precisa gastar agora para garantirmos o mínimo de 25%”.

Com isso, cabe à secretária (o) achar onde gastar em pouco tempo (às vezes horas antes da virada do ano). Isso resulta em gastos mal planejados e, em geral, não direcionados para áreas mais estratégicas, como ensino em tempo integral e valorização dos professores.

Outro problema está na pulverização dos recursos vinculados em órgãos não ligados diretamente à educação básica e às parcelas mais pobres da população. Para materializar, vamos pegar como exemplo o estado de São Paulo, que teve R$ 244 bi em receitas de impostos em 2023.

A Secretaria Estadual de Educação, que atende 3.5 milhões de estudante, recebeu R$ 25,6 bi. Somados aos R$ 367 mi recebidos pela Fundação de Desenvolvimento da Educação temos cerca de R$ 26 bi para educação básica. Esse valor representa menos de 12% das receitas, longe dos 25% estabelecidos como mínimo. Os outros 13% vão para as universidades públicas estaduais: USP, Unicamp, UNESP, entre outras instituições de ensino superior.

Por aluno/mês de educação básica investimos cerca de R$ 620. Para comparar, a Polônia, que possui um PIB per capita relativamente próximo ao paulista, investe mais que o triplo. A média dos países da OCDE no ensino secundário é superior a R$ 3,8 mil, seis vezes mais. Já uma boa escola particular em São Paulo custa quanto mesmo?

Se consideramos a educação como prioridade, acredito que cabe uma discussão aprofundada sobre como melhorar a qualidade e focalização dos gastos vinculados, antes de entrar no mérito de acabar com uma medida recente que garante investimentos na área.

Ainda nem firmarmos os primeiros passos em questões elementares e que demandam recursos, como universalização da educação integral, valorização de professores, ampliação da educação infantil e já estamos pensando em abandonar o barco.

O editor, Michael França, pede para que cada participante do espaço “Políticas e Justiça” da Folha sugira uma música aos leitores. Nesse texto, a escolhida por Thiago Cardoso foi “Copo Vazio”, de Gilberto Gil.

Menu de acessibilidade