As respostas estão além da Internet, diz Todd Oppenheimer

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O jornalista Todd Oppenheimer, especialista em temas educacionais, seria um dos convidados internacionais da Contec Brasil 2014. Infelizmente ele não pode participar, mas suas ideias, que muitas vezes parecem estar na contramão de um mundo voltado para a tecnologia, merecem espaço no debate que envolve o tema Educação. Para ele, os alunos devem ser proibidos de usar telefones, mídias sociais e outros aparelhos eletrônicos pessoais no espaço da escola, a não ser, claro, que seja parte de algum projeto escolar (idealmente um bom!).

Outra colocação é a de que, no começo dos anos de adolescência, professores deveriam ensinar alunos a avaliar a credibilidade da informação na Internet, “especialmente da míriade de argumentos conflitivos”. Para completar, ele acha que professores deveriam dar deveres a alunos que os forcem a ir além da Internet para obter respostas.

Todd Oppenheimer trabalha na The Writers Grotto, uma cooperativa para escritores, produtores de filmes e outros artistas freelancers em São Francisco (EUA). Durante seus mais de 30 anos como jornalista, Oppenheimer escreveu para vários jornais e revistas, como a The New Yorker, The Atlantic Monthly, Newsweek, The Washington Post e o The New York Times. Recebeu diversos prêmios nacionais por seus artigos, inclusive um primeiro lugar no prêmio Editor e Repórter Investigativo [da sigla em inglês IRE]. É autor de The Flickering Mind: Saving Education from the False Promise of Technology, que também foi finalista do prêmio IRE e, apesar de ter ganhado alguns prêmios de prestígio e de ter sido muito bem resenhado quando foi lançado, foi apenas publicado em inglês nos EUA.

Qual é o tema do seu livro?

Esse livro fala sobre os contrastes marcantes entre as várias esperanças e promessas otimistas perpetuadas a respeito da tecnologia e a severa realidade de como é transformar essas promessas em realidade nas salas de aula. Mais especificamente, ele fala sobre como a tecnologia encoraja a impaciência, superficialidade e uma “mentalidade de atalho” nos jovens de hoje em dia; enquanto os princípios reais da educação pregam justamente o oposto. Como a maioria dos professores de longa data bem sabem, a arte do ensino depende da paciência, reflexão, detalhamento e profundidade. Como uma professora veterana me contou, ela aprendeu a sempre seguir um princípio simples: “Quanto mais músculo, mais memória”.

Como surgiu a ideia de escrevê-lo?

Eu chamei meu livro de “A Mente Inquieta: Salvando a Educação da Falsa Promessa da Tecnologia” por uma razão simples: desde os anos 1990, o interesse social em tecnologia de ponta virou uma febre tão grande que começou a se alastrar para além do público consumidor adulto (onde a tecnologia de fato pertence), para a cultura jovem e, mais prejudicialmente, para dentro das escolas. Como resultado, decisões sobre o currículo e gastos da escola foram tomadas pelo setor privado, que é motivado por prioridades muito diferentes das do setor público. No processo, os orçamentos das escolas foram arruinados por gastos com aparelhos que logo se tornam obsoletos, e precisam então ser atualizados, antes mesmo de professores e alunos se familiarizarem com o que foi comprado.

Em sua opinião, quais são os maiores desafios da educação?

Os maiores desafios no sistema educacional hoje são de dois tipos: o primeiro é preservar a capacidade de concentração, criatividade e esforço pessoal dos jovens (em vez de apenas esperar a informação e entretenimento chegarem até eles). Segundo, preservar o interesse em outras pessoas (em vez de aparelhos). Esse último ponto será mais importante nas próximas décadas, quando nossas vidas se tornarem cada vez mais transculturais. O empregado bem sucedido de amanhã será aquele que consegue entender outras culturas e resolver problemas criativamente, baseado numa compreensão profunda de história, filosofia e antropologia, além de várias outras ciências. Tecnologia pode ajudar em uma parte, e muito, especialmente com sites de Internet. Mas a maioria requer muita leitura, conversas inteligentes (face a face, não tela a tela) e trabalho paciente.

Em seu país, os professores estão preparados para lidar com a tecnologia na sala de aula?

Cada vez mais professores nos EUA estão virando adeptos de computadores, e a maioria de fato utiliza computadores em salas de aula, de uma forma ou de outra. O problema é que a maioria os utiliza da forma errada. Nos mais novos, quando a experiência tátil é crucial, eles sobreutilizam os computadores. Nos mais velhos — a partir do ensino médio — os jovens deveriam aprender como os computadores funcionam. Eles deveriam aprender a programar computadores, construir modelos de computadores, consertar hard drives etc. A maioria das escolas não faz isso, simplesmente aceitam computadores como sistema de entrega do programa comercial mais popular do dia. Isso é uma pena, e uma ironia terrível, já que o principal argumento para colocar computadores na escola é preparar os estudantes para o futuro.

Internet, redes sociais, muitas novidades. Como despertar o interesse dos alunos para a aprendizagem escolar?

A escola é a única instituição na nossa sociedade que foi construída para uma reflexão considerável. Isso deve ser protegido, hoje mais do que nunca. Então, algumas regras gerais. Primeiro, alunos devem ser proibidos de usar telefones, mídias sociais e outros aparelhos eletrônicos pessoais no espaço da escola, a não ser, claro, que seja parte de algum projeto escolar (idealmente um bom!). Segundo, no começo dos anos de adolescência, professores deveriam ensinar alunos a avaliar a credibilidade da informação na Internet, especialmente da míriade de argumentos conflitivos. E, terceiro, professores deveriam dar deveres a alunos que os forcem a ir além da Internet para obter respostas — livros antigos, por exemplo; especialistas que podem visitar e observar trabalhando; aos próprios experimentos e estudos na área, e por aí vai. Essa é a maneira de mostrar aos jovens os limites da vida na tela. Esses deveriam levar a projetos de longo prazo que alunos podem abordar com criatividade, sentimento de liberdade e diversão. Se isso acontecer, estarão mais orgulhosos daquele trabalho que de qualquer coisa que fizeram numa tela.

Quais são os problemas trazidos pela tecnologia?

Além das minhas respostas acima, eu fico preocupado com a ingenuidade dos oficiais de escola com as promessas que as empresas de tecnologia fazem em relação aos produtos. Na maioria dos casos, os tecnologistas não estão mentindo conscientemente — eles realmente acreditam no que estão vendendo. Mas não são fontes objetivas de conselho, e não sabem nada sobre as demandas reais da educação. Mesmo assim, os oficiais das escolas estão perpetuamente cegos para este fato.

O que acha da iniciativa da Feira do Livro de Frankfurt de realizar a Contec Brasil?

Eu aplaudo a Feira do Livro de Frankfurt por viabilizar esta conferência — e especialmente por convidar céticos como eu. É fácil encontrar pessoas para promover tecnologia, e várias delas são muito persuasivas. E por que não? Na superfície, todo argumento para mais tecnologia parece crível (é importante para os trabalhos de amanhã, destrava a criatividade, é a ferramenta do futuro etc.). O problema é que, quando você cava abaixo da superfície de como qualquer um desses argumentos se aplica à escola, eles caem por terra. Foi o que tentei mostrar no livro. 

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