Apenas aprovar 10% do PIB para educação tem pouco significado

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O prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), escolheu um “colega” dos tempos de Brasília para administrar, no secretariado municipal, uma área onde tem experiência: educação. Cesar Callegari e o ex-ministro uniram agendas quando o novo secretário era membro do Conselho Nacional de Educação.

 

A partir de janeiro, uma das áreas mais defasadas da capital paulista promete desafiar o conhecimento de ambos. Em entrevista exclusiva ao Brasil Econômico, Callegari fala de prioridades nas escolas paulistanas e brasileiras.

A secretaria de Educação conta com o maior orçamento entre as 27 da prefeitura, superior a R$ 7 bilhões. O que será prioridade em investimentos na área a partir de 2013?

A primeira prioridade é atacar o déficit muito grande na educação infantil, de zero a três anos, em relação às creches. A demanda na cidade é de 150 mil novas vagas e isso terá prioridade total na nova administração. Vamos construir novas unidades, com participação da Prefeitura no programa federal Pró-Infância para construção de 172 novas creches. Um dos primeiros atos de Haddad será constituir imediatamente uma força-tarefa para localizar terrenos na capital e implementar sua desapropriação. Além disso, vamos fazer um diagnóstico mais preciso da capacidade instalada atual de creches da prefeitura e das entidades conveniadas para verificar se é possível ampliar a matrícula de crianças, resguardando o padrão de qualidade. Seremos muito cautelosos, sem inchar as creches.

 

Também pretendemos ter um diálogo muito forte com o setor empresarial. Acreditamos que muitas empresas que desenvolvem responsabilidade social podem ser estimuladas a criar instituições educacionais, das quais seriam mantenedoras, para atendimento à comunidade e filhos de funcionárias.

 

Podemos ajudá-los a fazer isso com assessoria técnica da própria secretaria e do Sesi e Sesc. Com um convênio com a prefeitura, nós repassaríamos recursos para sua manutenção. Isso é mais que viável, e já está estabelecido em lei através do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).

E quando todos os terrenos disponíveis para novas creches estarão localizados?

A força-tarefa será constituída em janeiro e trabalhará com velocidade, mas não é apenas encontrar os terrenos. Tem que resolver a disponibilidade de cada um. Em muitos casos vira objeto de desapropriação, envolvendo vários setores da prefeitura. Não temos um prazo. O que o novo governo pretende é fazer todo o esforço para zerar o déficit de creches durante a gestão.

O modelo de CEUs teve boa continuidade na gestão Serra/Kassab em São Paulo?

Foi positivo o fato do modelo não ter sido desmanchado. Mas ele perdeu um pouco da sua vitalidade, e faremos todo o esforço para recuperá-la. Uma das propostas de Haddad é a construção de 20 novos CEUs e revitalizar a rede atual. A preocupação é que o CEU seja um pivô central articulador de políticas públicas na sua região, com atividades de cultura, saúde, formação profissional. Os CEUs têm bons dirigentes e equipamentos de qualidade. Agora trata-se de dinamizar o que já é bom.

Além da educação infantil, o MEC vai colaborar com recursos à prefeitura em quais outras áreas?

Uma meta importantíssima, já para este ano, era a alfabetização na idade certa. São Paulo está dentro do Pacto Nacional, que foi meu principal projeto em Brasília, mas temos que ser exemplares em São Paulo. Há recursos significativos do governo federal para esta atividade. Todos os professores alfabetizadores terão bolsa de estudos, com supervisão da Unicamp e Unesp.

São recursos que já estão no orçamento da União para 2013, portanto já estão garantidos para São Paulo. São livros didáticos, jogos educativos, biblioteca para salas de aula. Eu e minha equipe preparamos todo esse material no MEC. Chutamos a bola em Brasília e agora vamos marcar o gol em São Paulo. Mas os números de São Paulo são muito preocupantes: 27% das crianças da rede municipal têm chegado ao 5° ano do ensino fundamental sem estarem plenamente alfabetizadas. Isso é muito sério. Nossa meta é alfabetizar todas as crianças, sem exceção, até o 3° ano fundamental. Vamos fazer de São Paulo um exemplo. Os indicadores do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) paulistano têm sido acanhados diante do potencial da rede municipal.

 

Queremos evoluções de qualidade na educação já a partir da Prova Brasil, em novembro de 2013. Um dos nossos compromissos é implantar na cidade cerca de 31 polos da Universidade Aberta do Brasil. Vamos fazer uma política muito forte de valorização dos professores, proporcionando formação em pós-graduação, lato senso, stricto senso, especialização.

Má gestão, infraestrutura e desvalorização do professor sempre são fatores criticados na educação brasileira.

Qual o seu diagnóstico sobre isso em São Paulo?

A infraestrutura na cidade hoje está melhor. Praticamente não temos mais as escolas de lata, um avanço. Diminuiu muito também o famoso turno da fome. Não posso dizer se a gestão foi satisfatória ou suficiente, mas algo foi feito. Já a questão salarial é sempre um problema. Na média, os salários da rede municipal de São Paulo são melhores do que na região metropolitana e no resto do país. Isso não quer dizer que sejam suficientes. Temos que melhorar muito a remuneração e condições de trabalho dos professores para que todos recuperem o ânimo, o compromisso, isso é um dever do Estado.

Está prevista uma renegociação salarial a partir do ano que vem?

Temos a informação que o atual governo fez um acordo plurianual de reajuste de salários. Não há nenhuma grande pressão a respeito disso.

O que a obrigação de investimento de 10% do PiB e 100% das receitas dos royalties do pré-sal podem mudar na educação brasileira?

Depende de como os 10% do PIB se traduzem em recursos. A insistência do ministério da Educação de vincular os royalties à educação é porque são um recurso novo e visível. Apenas aprovar 10% do PIB tem pouco significado. Só isso não cria obrigações para gestores e entes federativos. Se fosse 10% a mais do ICMS, do IPTU, isso teria impacto. Já o PIB não transita no sistema das contas públicas como ICMS, IPTU, IPVA. Chegou a hora da verdade. Vamos ver se há coerência entre todos aqueles parlamentares que defenderam os 10% do PIB para educação, com seus respectivos esforços para vincular os recursos do petróleo ao setor. Enquanto os recursos são genéricos é fácil se posicionar, mas quando tem que tomar decisões concretas que afetam as contas públicas de estados e municípios, não.

O fato de Haddad ter sido ministro da Educação impõe mais responsabilidades à sua gestão na secretaria municipal?

Me dá mais conforto comparado aos outros secretários. Ele é uma pessoa que viveu intensamente os problemas da educação. Tenho convicção de que terei um respaldo que talvez não fosse tão fácil com um prefeito de perfil diferente.

 

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