Afronta no ensino infantil

A decisão do Ministério da Educação (MEC), sob o pretexto de dificuldades orçamentárias, de não encomendar livros de História, Geografia, Ciências e Artes pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) para o ensino fundamental em escolas públicas é uma afronta ao País. Apenas livros de Português e de Matemática estão garantidos no PNLD; os demais – que representam em torno de R$ 1 bilhão do gasto total estimado em R$ 3 bilhões – podem ter a compra postergada, escalonada ou, na pior das hipóteses, suspensa.

O desfalque inédito do PNLD, que completa 40 anos como raro exemplo de sucesso de políticas públicas voltadas à educação, com a aquisição e distribuição de livros didáticos para alunos e professores de todas as escolas públicas, é a síntese da falta de prioridade do governo. O fato de afetar diretamente crianças do primeiro ciclo escolar, do 1.º ao 5.º ano, torna ainda mais cruel, indefensável e revoltante a medida do MEC.

A resposta padronizada enviada pelo ministério ao Estadão, de que estuda fazer a compra escalonada “considerando o cenário orçamentário desafiador”, não convence nem justifica tamanha violação ao direito fundamental à educação. Isso não é falta de dinheiro, mas absoluta falta de vergonha.

Não se pode apelar a um cenário fiscal “desafiador” para suspender a compra de livros em um Orçamento que prevê, para este ano, R$ 226 bilhões para a educação pública. Não se pode falar em falta de dinheiro diante do orçamento de R$ 50,4 bilhões em emendas parlamentares, para que deputados federais e senadores cumpram a lista de prendas às suas respectivas paróquias políticas (sem contar o acordo com o governo Lula da Silva, que elevou para mais de R$ 59 bilhões as dotações do Executivo).

Decididamente, o motivo da suspensão da aquisição do material escolar não é falta de dinheiro. E ainda que adiante os livros sejam comprados – como se espera –, somente o fato de ter sido cogitada a sua suspensão já seria um escândalo. E considerando que o atraso nos contratos provavelmente fará com que os estudantes iniciem o período letivo sem o material completo de estudo, não seria exagero atribuir ao MEC responsabilidade pelo prejuízo à educação básica e aos seus milhões de alunos.

De acordo com reportagem do Estadão, os livros precisam ser negociados no máximo até agosto com as editoras para que haja tempo para serem produzidos e estarem nas salas de aula no início do próximo ano letivo. Do 1.º ao 3.º ano do ensino fundamental, as crianças fazem seus exercícios nos próprios exemplares, o que torna ainda prejudicial a compra parcial.

Em carta endereçada ao ministro da Educação, Camilo Santana, a Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos (Abrale) avalia que a situação “nos coloca a meio caminho do negacionismo da ciência, da arte e do saber historicamente acumulado”. Uma forma educada de lembrar ao senhor ministro que na educação o livro é a prioridade das prioridades.

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