Inovar no aprendizado é possível

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O dia é 7 de setembro de 1822. Eu e meus colegas estamos cavalgando atrás de Dom Pedro de Alcântara de Bragança, que segue para o riacho Ipiranga. A nossa expectativa é que iremos vivenciar um momento único na história do País”. O cenário dessa passagem aconteceu há quase dois séculos, mas pode ser recontado na sala de aula por meio de práticas pedagógicas diferenciadas como o role playing game, ou RPG, um jogo que consiste basicamente na criação e na interpretação de personagens em um universo fictício ou não.

Inovar, seja com materiais tradicionais do ambiente educacional, como lápis e papel, ou com as novas tecnologias, como os computadores e os celulares, é algo estritamente necessário para que o professor compreenda os alunos que estão presentes hoje nas escolas e torne suas aulas mais atrativas para esse novo público. “O que eu vejo como mais relevante mesmo é trazer o contexto em que essas crianças vivem para dentro da sala de aula.

Quando você afasta a tecnologia da escola, você cria um mundo à parte do mundo em que elas vivem, porque, hoje em dia, as crianças têm celulares com acesso à internet, computadores em casa, notebooks. É um mundo que elas já conhecem. Então porque não utilizar, dentro da escola, uma ferramenta que elas já têm, já conhecem e gostam de usar?”, indaga Mariana Ferreira Gomes Correa, pesquisadora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Guilherme Xavier, desenvolvedor de jogos, escritore CEO da Donsoft Entertainment, concorda: “A escola absorver para si, para sua prática, questões oriundas de uma sociedade informativa, que é essa que a gente está vivendo, não só é necessário, mas também fundamental”. A Profissão Mestre conversou com os educadores durante a III Feira Cultural do Livro de Ouro Preto Conexão @OuroPreto, em novembro de 2013, onde ambos ministraram oficinas.

Se existe o consenso de que as novas tecnologias devem ser inseridas no cotidiano escolar, há também um grande obstáculo: Como o professor pode capacitar-se e diminuir a lacuna em conhecimento sobre tecnologias que existe entre alunos e docentes? É algo que pode ser solucionado por meio do empirismo. “O processo de reciclagem passa pelo interesse em saber o que está acontecendo, em ver o que os alunos estão usando. Do ponto de vista de um profissional que tem que estar sempre antenado, isso é extremamente necessário”, atesta Xavier. Essa prática também é defendida por Tulio Drumond, diretor de programas e roteirista da Rede Minas de televisão, outro palestrante do evento.

“É um processo de aprendizagem um pouco diferente do tradicional. É preciso que a pessoa veja o que é assimilável, para ela, da tecnologia. Não há um método criado para todas as disciplinas, mas para cada uma é preciso que o professor encontre qual é a interface, a nova mídia ou o elemento tecnológico que possa ajudá-lo na sua didática”.

Outro risco existente no uso de aparelhos tecnológicos em sala de aula é a distração, que ainda é vista por muitos como um problema, mas que pode ser benéfica: “Todos nós, quando usamos o computador para trabalhar, paramos para ver o e-mail, damos uma olhada para ver se tem uma notificação no Facebook. Eu acho que esses momentos, esses intervalos são necessários.

A mente humana não consegue se focar por uma, duas horas direto, sem um intervalo”, afirma Mariana. Já para Xavier e Drumond, a alternativa é fazer com que os alunos se apropriem da tecnologia para aprenderem até mesmo durante o descanso. “Antes de buscar uma relação antagônica entre o conteúdo programático e algo que distraia o aluno, é preciso pensar em como o aluno, distraindo-se, pode estar aprendendo; como esse aprendizado pode ser algo tão natural para o aluno como quando ele era bebê e aprendeu a andar, falar, brincar”, explica o desenvolvedor. Já Drumond acredita que, como os alunos já são acostumados com os dispositivos, a aprendizagem é menos trabalhosa: “Eu enxergo como saída para o professor trazer esse aluno com essa interface para dentro da sala de aula e propor desafios mais dinâmicos, porque o aluno passa a ver outro uso para aquela determinada interface, para aquele hardware”.

Confira a seguir sugestões de atividades que utilizam tanto as novas tecnologias como os materiais já tradicionais da sala de aula.

Criatividade com o computador

O computador já é um elemento bastante comum nas escolas. Segundo dados da pesquisa TIC Educação 2012, realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), a ferramenta está presente em todas as 856 instituições entrevistadas e, entre elas, 74% contam também com computadores portáteis (notebooks e netbooks). Mesmo assim, o que se vê ainda são professores que utilizam os PCs apenas para mostrar apresentações de slides ou vídeos, muitas vezes ignorando a interatividade e o imediatismo que a ferramenta propõe.

Mariana Correa, pesquisadora da PUC-Rio, defende que o bom uso dos computadores passa não só pela aula expositiva, mas também pelos momentos em que os alunos “põem a mão na massa”. “É válido ter um momento expositivo, com certeza, mas o mais interessante é que o aluno possa mexer nisso. No curso, eu estava mostrando para os professores uma ferramenta colaborativa que a gente pode usar: o Google Drive (drive.google.com), no qual você tem, digamos, um pacote Office, podendo criar documentos, planilhas etc. Na sala de aula, você pode criar um texto colaborativo, com todo mundo escrevendo em tempo real ali.

Você vai ver a contribuição de cada um, enquanto está construindo aquele momento”, exemplifica Mariana, que defende que o ideal não é um computador por aluno, mas que vários estudantes utilizem a mesma máquina. “Assim, você promove o trabalho não só com a tecnologia, mas ao mesmo tempo está tendo uma discussão, porque todos eles estão participando”, justifica.

Mariana também acredita que o professor não deve procurar plataformas específicas para a educação, mas sim adaptar e utilizar as ferramentas que já estão presentes em seu dia a dia. “Quando você tem que trazer uma tecnologia exclusivamente para a sala de aula, há todo um processo de aprendizado daquela ferramenta que está dissociado do que você já faz. Sugiro que o professor use o YouTube, o Google, o Google Drive e as ferramentas incluídas ali”, afirma a pesquisadora, que vai além e indica uma proposta diferenciada: “Por que não usamos as videoconferências para falar com profissionais de áreas específicas que não podem vir para a sala de aula dar uma palestra? Se você fizer uma videoconferência, eles estarão disponíveis para atender às dúvidas dos alunos. A gente tem essa possibilidade de aproximar as pessoas que normalmente nunca teríamos contato”.

Vivenciando a História

Criado em 1974, o role playing game, ou RPG, é um jogo que consiste basicamente na criação e na interpretação de personagens em um universo fictício ou não. Os jogadores obedecem às instruções do mestre do jogo, que é quem conta a história e dita os rumos do jogo. Por causa dessa estrutura simples, mas versátil, o RPG pode ser uma boa alternativa também para quem quer inovar na sala de aula, sem nem mesmo precisar das novas tecnologias.

Para Tiago Silvério, pesquisador da PUC-Rio e que também palestrou na III Feira Cultural do Livro de Ouro Preto Conexão @OuroPreto, o jogo se encaixa no cotidiano da escola. “O RPG pode muito bem ser aplicado na escola, principalmente para aulas de História, de Redação e de Português”, afirma Silvério, que sugere um importante momento histórico do Brasil como pano de fundo para uma partida de RPG em sala de aula: a independência do Brasil.

“E se eu falar que vocês estão no Brasil Imperial, cada um com o seu cavalo, indo junto de Dom Pedro. Eu lhes dou a opção: o que vocês vão fazer? Eu posso criar uma narrativa. ‘Nós vamos seguir Dom Pedro’. Então eles seguem Dom Pedro e eu vou narrando o que está acontecendo, o ambiente etc. Estou botando eles na história. Eu não estou contando a história para eles, a história é deles, eles são parte da história e [o fato de] estarem inclusos nisso torna a coisa mais interessante. Você não está só ouvindo, você está participando e isso é legal para todo mundo: criança, adolescente, adulto, idoso”, explica.

O ponto positivo para o jogo em questão é que ele não necessita de aparatos tecnológicos (pelo menos não na hora de jogar). Basta o professor pesquisar e compreender a essência do RPG. “O professor deve também perder o preconceito sobre o RPG, buscar livros sobre o jogo para saber o que é e como usar. RPG não é difícil, pois qualquer um sabe contar uma história”, complementa Silvério. O pesquisador destaca também que a atividade pode tanto ter um olhar didático como ser um momento mais lúdico, de lazer. “Se o professor quer contar uma história, um fato que aconteceu no Brasil, ele pode dizer o que está acontecendo, dependendo do que aconteceu na realidade, baseado em fatos. Agora, se ele quiser fazer uma atividade lúdica, para estimular a criatividade das crianças ou então incentivar adolescentes e adultos a pensarem como crianças, o que é uma coisa muito boa, o professor pode dar a eles a liberdade de criar”, diz.

 

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