Tudo igual

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A proposta do Ministério da Educação (MEC) de unificar os currículos escolares do Brasil ainda vai render muito debate em 2012. Trata-se de um documento chamado “Expectativas de Aprendizagem”, que apresentará orientações complementares às novas diretrizes curriculares, estas propostas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) em 2010.

 

De acordo com a assessoria de imprensa da Secretaria de Educação Básica do MEC, o intuito é estabelecer objetivos e direitos de aprendizagem a serem alcançados pelos alunos. Para isso, serão delineadas as experiências a serem vivenciadas por eles, a formação e as condições necessárias para a realização das expectativas de aprendizado.

 

O documento está em fase de ajustes. A previsão é de que as orientações comecem a valer nas escolas de todo o Brasil a partir do ano letivo de 2013. “A proposta não é repetir os formatos de listagem de conteúdos. O objetivo é oferecer um instrumento de organização da vida do professor e do aluno”, explica a assessoria em nota enviada por e-mail à equipe do Caderno Escola.

 

O receio é que a unificação dos currículos se torne um instrumento que engesse a atividade de professores e escolas, que terão menos liberdade para definir seus conteúdos e sua atuação didática. Aparentemente, este receio não chega a ser um risco. Diretora-executiva do Movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz afirma que a proposta vai, na verdade, ajudar o professor.

 

“Não é para engessar o trabalho em sala de aula. A habilidade pode ser consolidada nos alunos de diversas formas, por meio do uso de várias ferramentas que levem os alunos à aprendizagem”, aponta. Ela conta que hoje não há nenhum padrão, o que deixa o campo de atuação do educador muito aberto. “É injusto soltar a bomba para o professor e esperar que ele se vire.”

 

Por outro lado, pensar em um aprendizado mínimo também incomoda. “O uso desta palavra indica que a criança não precisa aprender tudo, mas se ela aprender esse pouquinho já está bom. Não pode ser assim”, argumenta a presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Cleuza Repulho. Ela conta que a organização concorda que exista um currículo básico, não um currículo mínimo.

 

Sem obrigação


Cleuza acrescenta que a aprovação da proposta do MEC depende, claro, de que municípios e estados continuem tendo autonomia. Mas ela mesma explica que o documento de parâmetros curriculares do MEC não será uma lei, impondo obrigatoriamente o currículo. Para a presidente, isso já ajuda no processo de entendimento e também de aceitação.

 

Doutor em Educação pela Unive­r­sidade de São Paulo (USP), o professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) João Ferreira complementa o argumento de Cleuza. Ele informa que diretrizes curriculares para todo o país já existem, são ditadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e são obrigatórias. “O CNE baixa uma resolução para orientar cada etapa do ensino.”

 

Essas diretrizes são apenas orientações, muito gerais, por isso, elas são traduzidas. Cada estado e município estabelece, a partir da resolução do conselho, os seus parâmetros curriculares. A enorme diversificação curricular entre as escolas brasileiras se dá justamente por essa adequação que cada secretaria faz. O documento do MEC visa estabelecer parâmetros curriculares base, para evitar isso.

 

Não ser obrigatório pode ser vantagem ou desvantagem. “Durante o governo FHC foram elaborados parâmetros curriculares para o ensino fundamental, mas eles não tiveram o impacto que se esperava na prática do professor. De nada adianta a definição dos parâmetros se o professor não for formado nessa perspectiva, se não tiver formação continuada”, argumenta Ferreira.

 

O professor acrescenta que é possível ter excelentes diretrizes curriculares e não colocá-las em prática. Priscila confirma que a equidade e a qualidade da Educação brasileira dependem de muitas outras políticas. Segundo ela, o currículo comum é só uma delas. “Não existe nenhuma política única que consiga melhorar sozinha o ensino no país.”

 

Provas e livros didáticos

A diretora-executiva do Todos pela Educação enfatiza que o documento do MEC não irá adiantar se não houver mudanças também na formação de professores, na valorização da profissão, em tudo. Mas ele já tem a potencialidade de resolver dois problemas: o uso do livro didático como direcionamento curricular e o ensino apenas como preparo para as avaliações.

 

Para Cleuza, o grande objetivo da proposta do MEC é evitar que as escolas façam do índice do livro didático o seu plano de ação. “Muitas fazem isso, o que não deve ser assim. O material é uma parte desse processo, não o norteador”, considera a presidente da Undime. Ferreira também aponta este problema.

 

 “Muitas vezes o que pauta o currículo na escola é o livro didático, não as diretrizes e os parâmetros curriculares.”

 

Pode ser que o currículo escolar seja pautado não pelo livro, mas pelas avaliações: Provinha Brasil, Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), etc. Segundo o professor da UFG, muitas vezes, são esses exames que induzem o que vai ser ensinado, quando, na verdade, é o contrário que deveria acontecer.

 

“A formação é que deveria dizer o que deve estar na prova”, enfatiza. Mesmo assim, as políticas educacionais do país têm se pautado mais pela avaliação do que pelo currículo. Ferreira explica que isso acontece porque o resultado da prova é imediato, gera um impacto, mas proporciona também um desconforto nos professores. “É um equívoco pedagógico sobrepor o exame à formação.”

 

Para ele, a discussão atual sobre projeto curricular é tardia, deveria ser a primeira discussão em prol do ensino e constante. “Ninguém fala para as escolas o que é esperado delas, mas eu vou lá e avalio. É injusto, inclusive”, complementa Priscila.

 

Ela indica que é difícil avaliar a aprendizagem, e por isso um documento que oriente as escolas se faz necessário. “Temos que falar o que vamos avaliar, mas cada estado ou município vai desenvolver suas políticas para garantir a aprendizagem”, confirma a diretora.

Ainda superficial

 

O Ministério da Educação (MEC) anunciou no início de dezembro de 2011 que vai propor uma base curricular nacional, com expectativas de aprendizagem para a Educação Básica. Doutor em Educação, o professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) João Ferreira afirma que o assunto foi bastante discutido em 2011, mas ainda haverá muitas discussões em 2012.

 

O documento com a base curricular nacional será disponibilizado para consulta pública e participação da sociedade. A previsão é de que ele seja divulgado em julho e concluído no final deste ano. Diretora-executiva do Todos pela Educação, Priscila Cruz enfatiza que o objetivo do documento é deixar claras quais expectativas a sociedade brasileira tem em relação ao ensino de cada série.

 

Polêmica

Segundo o professor Ferreira, a maior polêmica da proposta está nas expectativas de aprendizagem. “É você dizer que no Ensino Fun­damental se aprende isso, e no Ensino Médio se aprende aquilo, porque assim não fugimos do receituário de prova que já existe”, aponta. O ideal seria trabalhar com os marcos curriculares.

 

Cada estado e município teria alguns marcos comuns, conhecimentos que devem ser trabalhados em cada disciplina, habilidades, competências a serem desenvolvidas, etc. Marcos que respeitariam o que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) exige: uma base comum nacional (para o país inteiro) mais uma base diversificada (que cada estado e município defina).

 

Ferreira acredita que os parâmetros curriculares nacionais devam englobar orientação teórica, conceitual e também a orientação metodológica. “Não sei se as discussões vão chegar em nível da orientação metodológica, de como trabalhar esses componentes curriculares. Ainda não sabemos se vai evoluir para isso.”

 

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