Reforma ortográfica pode gerar custos de R$ 40 milhões

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Com as mudanças ortográficas na língua portuguesa, que entraram em vigor no dia 1º de janeiro, editoras, livrarias e gráficas começam a se adaptar às transformações. Entretanto, boa parte das editoras ainda tem como estratégia de ação atualizar seu acervo paulatinamente, de maneira a minimizar os gastos durante o período previsto de três anos para a adesão obrigatória.

A estimativa, de acordo com Rosely Boschini, presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL), é que a conta para que as editoras se adaptem às mudanças pode passar dos R$ 40 milhões ao ano até o final de 2012, considerando-se apenas os gastos para revisão e reimpressão, já que dois terços dos 45 mil títulos trabalhados em 2007 eram reedições.

“Sentimos que o apoio das editoras vem sendo gradativo, mas constante. Muitos livros de primeira tiragem já foram incorporados. O preço de revisão por título para segunda tiragem, por exemplo, custa em torno de R$ 1,5 mil a R$ 2 mil para uma quantidade média de 250 páginas, e isto representa um gasto extra significativo”, analisa Rosely.

Perante tal exigência de investimentos — e diante da possibilidade de eventuais descartes de estoques nas livrarias —, é natural que parte das editoras permaneça cautelosa em relação à adesão, principalmente no que se refere aos gastos que não estavam no orçamento. “Antes de aderir, o foco deve ser angariar recurso pessoal e financeiro”, completa a presidente da CBL.

E os sacrifícios podem ser ainda maiores. As normas da nova ortografia — que alteram a acentuação de algumas palavras, acabam com o uso do trema e modificam a utilização do hífen, por exemplo — foram incorporadas à quinta edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp), lançada no dia 19 de março pela Academia Brasileira de Letras (ABL), depois de diversos títulos já terem sido atualizados e colocados nas lojas.

Marcelo Martins, diretor de marketing da Abril Educação, que controla as editoras Ática e Scipione, acredita que o lançamento do volume (de 887 páginas) pode ter sido precipitado, já que outros países de língua portuguesa, como Portugal, ainda não ratificaram o documento. “Publicamos o Volp em uma iniciativa isolada e vamos ter de dialogar com os outros países depois, porque ainda existem muitas dúvidas e alguns ajustes a serem feitos”, lembra.

O impacto da reforma não se restringe ao mercado editorial. Segundo Alfried Plöger, presidente da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf), é difícil fazer qualquer estimativa neste momento, mas para as gráficas o balanço total da reforma pode, ao final, ser lucrativo. “Não é viável falar em números neste momento, mas sabemos que, lucrando ou não, as gráficas sofrerão pressão para tentar socializar os gastos adicionais das editoras”, afirma.

Plöger, que também preside o conselho da Melhoramentos, acredita que a meta deva ser escoar os estoques, dando atenção especial a livros de rotação mais lenta e preço maior, como os de arte. “É o consumidor que vai acelerar ou não a atualização. Tenho dúvidas em relação ao desinteresse dele por livros que, querendo ou não, sofreram pouquíssimas alterações. Acho cedo para falar em prejuízo, já que até 2012 os títulos vão manter a dupla ortografia.”

Estratégia

Entre as empresas que iniciaram a adequação de seu acervo está a editora Melhoramentos, que publicou cerca de 300 mil títulos atualizados em 2009, entre lançamentos e reedições. Breno Lerner, diretor geral da empresa, explica que a linha escolar e prática já está quase toda reformada, assim como 50% dos livros de literatura publicados pela editora, que representam algo em torno de 600 títulos. “Nosso critério foi iniciar a adaptação pelos títulos de maior vendagem e pelos dicionários, em julho de 2008. Desde então, já gastamos cerca de R$ 1 milhão e acredito que até o fim a atualização ainda deverá nos custar algo em 
torno de R$ 300 mil”, calcula.

Nas editoras Nacional e Ibep, a revisão demandou a contratação de uma equipe extra de 30 pessoas no final de 2008, conta Jorge Yunes, presidente da Associação Brasileira de Editores de Livros (Abrelivros) e do Ibep – Companhia Editora Nacional, que detém as editoras Conrad e Nacional.

Na Editora DCL, 20% dos livros já estão em dia com a reforma, e a meta é finalizar todo o acervo nos próximos 18 meses. Otacília de Freitas, editora executiva da DCL, conta que não há expectativa de prejuízo. “Não vamos recolher nenhum livro até 2012 e não acho que será preciso, pois trabalhamos com tiragens baixas. A reforma não será um peso, afinal, já iríamos gastar com reedições, então não há custo excedente”, avalia.

Primeiros da fila

Com a volta às aulas, a atenção maior foi para os livros didáticos e dicionários, uma vez que o prazo determinado pelo Ministério da Educação para as editoras entrou em vigor em 2009, e os livros a serem utilizados deveriam estar prontos cerca de seis meses antes do início do ano letivo — o principal período de vendas para este segmento.

“As livrarias tiveram uma forte procura pelos didáticos e dicionários e trabalharam com um estoque mínimo neste ano. A estimativa é que a perda de estoque no didático tenha sido de 5% no início do ano letivo”, explica o presidente da Associação Nacional de Livrarias, Vitor Tavares.

No Brasil, o governo federal compra quase metade dos livros didáticos publicados. Em 2007, o faturamento relativo às obras encomendadas pelo governo foi de R$ 971 milhões, de acordo com dados da pesquisa de mercado realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) juntamente com a CBL e o Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel). “De início, haverá um forte investimento, mas as editoras que publicam livros didáticos vão ser compensadas futuramente”, esclarece Rosely.

Na Abril Educação, o mutirão contou com uma equipe de 200 profissionais, durante dois meses, que trabalharam principalmente nas gramáticas e dicionários. “Não recolhemos exemplares, mas o gasto com a adaptação dos didáticos e paradidáticos foi bastante representativo. Já colocamos no mercado, desde agosto de 2008, algo em torno de 4 a 5 milhões de livros com a nova ortografia”, conta Martins, da Abril Educação.

A Editora Abril, por meio do Núcleo Infantil de publicações e produtos licenciados, fechou parceria com o cartunista Mauricio de Sousa para o lançamento do livro Turma da Mônica – A Reforma 
Ortográfica em Versinhos. O conteúdo foi desenvolvido pela poetisa Yara Maura, autora de diversos livros para crianças.

Reforma deve abrir novos mercado

O português tem mais de 240 milhões de falantes ao redor do planeta, sendo a quinta língua mais falada no mundo. Este é o principal motivo para que se entenda o acordo ortográfico como uma oportunidade para que o Brasil, mas não só ele, obtenha uma série de vantagens no mercado editorial, já que a adaptação do idioma proposta pela reforma deve ajudar a abrir mercado dentro de outros países, como Portugal, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste.

“Existe uma demanda muito grande de feiras de livros por autores brasileiros, e eu tenho absoluta certeza de que esta vai ser uma grande oportunidade para colhermos frutos”, avalia Rosely Boschini, presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL). Alfried Plöger, presidente da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf), acrescenta que o Brasil tem uma vantagem competitiva em termos de impressão e custo. “Esse mercado foi prospectado por outros países, principalmente Portugal, por isso vimos resistências muito grandes por parte deles em aderir à reforma”, conta. 

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