83% dos alunos têm professor insatisfeito, afirma a Unesco

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Os professores brasileiros, com exceção apenas de seus colegas uruguaios, são os mais insatisfeitos com seus salários, segundo um relatório divulgado ontem pela Unesco, no comparativo entre 11 países em desenvolvimento. No estudo, 83% dos alunos do ensino primário (equivalente, no caso brasileiro, aos quatro primeiros anos do ensino fundamental) estão em classes cujos docentes se declararam insatisfeitos com os salários.  
 
O relatório também mostra, como já evidenciado em outros estudos da Unesco, que as taxas de repetência no ensino primário no Brasil destoam, e muito, das de outros países.  
 
No Brasil, a repetência chega a 19% dos alunos no ensino primário, mais que o dobro da verificada no segundo país com maior percentual, o Peru, com 8,8%.  
 
O estudo da Unesco, intitulado “Um Olhar para o Interior das Escolas Primárias“, faz parte do programa WEI (sigla, em inglês, de Indicadores Mundiais de Educação), que monitora a educação em países em desenvolvimento.  
 
Duplo emprego  
 
Sobre o alto grau de insatisfação dos professores brasileiros com seus salários, o representante da Unesco no Brasil, Vincent Defourny, destaca outro dado do relatório, que mostra que o percentual de alunos cujos professores trabalham em mais de uma escola chega a 29% no Brasil, o maior entre todos os países analisados.  
 
Não por acaso, os outros dois países com maiores percentuais nesse quesito são Argentina e Uruguai, onde igualmente o nível de insatisfação com o salário chega a mais de 80%. “Todo mundo que trabalha sabe que uma dupla jornada afeta o desempenho. Isso tem certamente impacto em sala de aula“, diz Defourny.  
 
A professora Sandra Aparecida Martins Ferreira, 38, concorda. Ela leciona tanto na rede estadual quanto municipal na zona leste de São Paulo. As nove horas e meia de trabalho diárias lhe rendem ao final do mês R$ 2.200.  
 
“É muito pouco, considerando o desgaste que temos. Os alunos vêm cada vez mais com problemas familiares e nós não conseguimos desenvolver o que desejamos. É frustrante“, diz Sandra, que dá aulas para estudantes de 1ª a 4ª séries.  
 
Infra-estrutura  
 
Na maioria das situações analisadas pelo estudo –como a infra-estrutura das escolas ou as condições de oferta do ensino- o Brasil se encontra perto da média dos países analisados –não foram analisados dados de países desenvolvidos.  
 
Os brasileiros, por exemplo, não se mostraram tão insatisfeitos em relação ao número de alunos por turma, a participação dos pais de alunos na escola ou a oferta de material didático. 

No caso do número de alunos por turma, por exemplo, 34% estudam em classes cujos professores demonstraram algum grau de insatisfação com a questão. A média no ensino primário brasileiro é de 27 crianças por sala de aula. A maior relação foi encontrada na Índia (51 por sala), e a menor, na Malásia (18 por sala).  
 
 
Brasil investe bem menos que o Chile no ensino primário, segundo relatório 
Folha de São Paulo (Rio de Janeiro) 
 
Além de ter professores insatisfeitos com seus salários, o Brasil também não é o país que mais investe no ensino. O gasto médio brasileiro por aluno do ensino primário, de US$ 1.159, é bem superior ao de países que estão no fim da fila, como Peru (US$ 479) ou Índia (US$ 484), mas fica bem abaixo do Chile (US$ 2.120), segundo o relatório da Unesco. 
 
Na comparação dos valores em dólares, a entidade leva em conta o custo de vida em cada um dos 11 países em desenvolvimento incluídos no estudo. 
 
Para Vincent Defourny, representante da Unesco no país, a distância do Brasil em relação ao Chile mostra que seria possível investir mais. 
 
Ele destaca que o relatório também mostra que, enquanto no Brasil a média de tempo de um aluno em sala de aula é de 800 horas por ano, no Chile ela chega a 1.200 horas. 
 
“Uma educação de melhor qualidade é também uma educação em que o aluno passa mais tempo em sala. Isso certamente tem um custo, mas que se reflete na qualidade“, afirma Defourny. 
 
O representante da Unesco afirma ainda que um ponto importante do relatório e comum a todos os países analisados é o alto grau de desigualdade nas condições de acesso à educação. 
 
“A escola não está funcionando como um corretor das desigualdades nesses países.“ 
 
Família 
 
O estudo da Unesco também analisou algumas características familiares que normalmente interferem de forma negativa no desempenho dos estudantes. 
 
Entre os países analisados, o Brasil aparece com percentuais acima da média no caso de alunos que vivem em casas onde há menos de 25 livros disponíveis e no de famílias monoparentais, ou seja, em que há só a mãe ou o pai. 
 
 
 
Levantamento considerou nº de alunos por sala
Folha de São Paulo (Rio de Janeiro) 
 
O objetivo da pesquisa divulgada ontem pela Unesco foi levantar dados a respeito de escolas primárias a partir da perspectiva dos estudantes. 
 
Por essa razão, mesmo que tenham sido professores e diretores os que responderam à pesquisa, a maioria dos resultados é apresentado de acordo com a proporção de alunos que estudam em escolas com determinadas características. 
 
Com isso, em vez de apenas apresentar o percentual, por exemplo, de professores que demonstraram alguma insatisfação com o salário, o estudo levou em conta quantos alunos estudam com professores que demonstraram-se insatisfeitos. 
 
Com essa metodologia, corrige-se o peso de um professor satisfeito com seu salário, mas que dá aulas, por exemplo, para apenas dez alunos, enquanto outro insatisfeito pode ter em sua sala de aula 50 estudantes. O que conta, nesse exemplo, não é cada professor, mas para quantos alunos ele dá aula. 
 
Isso pode dificultar a interpretação, mas ajuda a ter uma idéia melhor de quantos estudantes são beneficiados ou prejudicados em cada uma das características investigadas. 
 
O representante da Unesco no Brasil, Vincent Defourny, alerta que estão sendo comparados só 11 países com algumas características semelhantes, mas também com particularidades que os distinguem. 
 
 
Colaborou Fábio Takahashi, da Folha de S.Paulo.  

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