Fortaleza é líder em venda ilegal de livros

Para muitas pessoas, a advertência “venda proibida“ estampada na capa dos livros escolares nada significa. No Brasil, a venda de livros didáticos exclusivos do professor, proibida por lei, movimenta cerca de R$ 200 milhões por ano. Fortaleza ostenta um título desonroso nesse tipo de atividade ilícita, o de ser a capital brasileira onde mais se vende livros de modo ilegal. Belo Horizonte (MG) ocupa a segunda posição. As informações são da Associação Brasileira de Editores de Livros (Abrelivros), entidade nacional que reúne as empresas do setor.  
 
Nos últimos três meses, três operações foram realizadas pela Delegacia de Defraudações e Falsificações (DDF), com apoio da Abrelivros, para coibir esse tipo de crime. A ação mais recente, na tarde de ontem, no Centro de Fortaleza, resultou na apreensão de cerca de mil livros e na prisão de três homens: Luilson Freitas Bezerra, 46, Antonio Ronaldo Dias, 27, e Afonso Nóbrega de Souza, 49. Somadas às duas operações anteriores, o número total de publicações apreendidas chega a 2,3 mil, número equivalente ao de alunos de uma escola de grande porte da Capital.  
 
Segundo o advogado da Abrelivros, Dalizio Barros, as prisões ocorreram a partir de informações fornecidas à entidade por ligações anônimas e e-mails. O grande número de ocorrências registrado em Fortaleza é algo atípíco até mesmo se comparado a outras capitais nordestinas. “Não se pode dizer que isso é um caso do Nordeste. Em cidades como Recife, o comércio ilegal de livros é grande, mas não nessa proporção. Em Fortaleza, essa prática é mais exposta“, relata o advogado.  
 
Direito autoral  

Além da violação dos direitos autorais, Dalizio Barros afirma que a venda de livros do professor também pode ser vista como um “crime educacional“. “O aluno que possui o livro com as respostas vira o ’esperto’ da classe. Isso faz com que os alunos deixem de estudar e passem apenas a copiar as respostas que estão no livro, o que contribui para o fracasso das escolas“, explica.  
 
O livro do professor é uma estratégia de promoção usada pelas editoras para que determinada coleção seja adotada na escola. O problema começa quando o professor resolve vender o material. Embora a ação do professor seja definida legalmente como um ilícito civil, ou seja, não prescrito no Código Penal Brasileiro (CPB), a pessoa que compra o livro e a revende pode ser enquadrada criminalmente por violação do direito autoral, artigo 184 do CPB. A pena varia de dois a quatro anos de reclusão com multa.  
 
E MAIS  
 
Na edição de 26 de janeiro de 2001, O POVO já registrava a venda ilegal de livros didáticos na Praça dos Leões. Exemplares que deveriam ser distribuídos gratuitamente a alunos da rede pública e livros do professor estavam sendo vendidos nas bancas da praça. Na ocasião, dois representantes do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) estiveram em Fortaleza para investigar o caso.  
 
Com uma lista de livros didáticos adotados por um colégio de Fortaleza, O POVO foi às compras. Em apenas duas tentativas, o livro foi encontrado. Na capa, o aviso “venda proibida“, em letras garrafais, não impediu que o livro fosse vendido por R$ 15,00, frente ao preço inicial de R$ 20,00. “Muitos desses livros a gente consegue através de troca. Às vezes, professores vendem para gente“, confessou o vendedor. 
 
Maior repressão policial no comércio 
 
Na Feira do Troca-Troca, na Praça dos Leões, no Centro de Fortaleza, a venda de livros do professor ocorre de maneira velada. Para alguns vendedores, o assunto é tabu. Uma comerciante afirma não vender livros do professor e diz que a repressão policial contra esse tipo de prática aumentou nos últimos meses. Mas o assédio é grande. “Os professores vêm vender os livros pra gente. A proibição tem de partir das editoras“, comenta.  
 
Mais à frente, um outro vendedor também garante que todos os livros ali expostos são do aluno. Segundo ele, o livro do professor tem uma desvantagem: é vendido por um valor menor que o de um livro didático comum. “Os pais costumam procurar os livros do aluno, porque são mais novos. Tem livro que parece que nem foi usado“, afirma.  
 
À distância de pouco mais de três metros, sentada em um banco, uma mulher usa um corretivo para apagar as respostas de um livro. Um pouco mais escondido, após a primeira fila de vendedores, um homem fornece instruções a outro: “Pega dois livros do professor no meu carro, toma a chave!“. Ao notar a presença do O POVO, o tom da conversa muda, fica mais teórico. De acordo com seu relato, há pais que já o procuram na intenção de comprar a versão do professor. O material destinado à pré-escola é o mais visado. Os entrevistados não quiseram ser identificados. 
 

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