Seminário – PNBE: O direito de Ler Literatura

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Nos dias 25 e 26 de Novembro de 2002 aconteceu o 4º Seminário do Salão do Livro para Crianças e Jovens, organizado pela FNLIJ, com o tema “PNBE: O direito de Ler Literatura“ . A seguir reproduzimos dois textos com reflexões de participantes do evento:
 
 
 I- CBL QUER A CONTINUIDADE DO PNBE

O Programa Nacional Biblioteca Escola é certamente uma das iniciativas mais positivas e importantes de política educacional adotada nos últimos anos, e com alguns aperfeiçoamentos está destinado a ser um dos grandes marcos do desenvolvimento da educação brasileira. Esta foi a posição defendida pela CBL na mesa-redonda sobre “A Opinião dos Editores sobre o PNBE”, realizada dia 26 durante o 4º Salão do Livro Infantil e Juvenil do Rio de Janeiro. Pela CBL participaram o vice-presidente José Henrique Grossi e o diretor de assuntos institucionais, Felipe Lindoso.

Para Grossi, “O PNBE é um marco no esforço de fazer com que a escola encare a leitura como instrumento básico de formação cidadã para nossas crianças: “Nesse sentido, é importante que todas as pessoas ligadas à questão da educação, do livro e da leitura em nosso país se manifestem a favor de sua continuidade.”

Por outro lado, o vice-presidente fez questão de ressaltar que o programa tem erros de formatação sérios que precisam ser corrigidos. Alguns são fruto de sua novidade e do caráter exploratório que um programa dessa magnitude tem; outros são cópias equivocadas de métodos aplicados em outros programas de aquisição de livros.

O principal problema é a eliminação dos professores na escolha do material que convém ao projeto educacional das escolas. “Essa conquista foi alcançada no programa do livro didático há 17 anos e não pode ser abandonada. Pelo contrário, tem que ser aprofundada, apoiada com informação e formação para os professores, avaliação de livros ofertados, inclusão de guias de trabalho com materiais literários”, comentou Grossi.

Durante a mesa-redonda, foram destacados os avanços registrados nos parâmetros curriculares aprovados e difundidos pelo MEC na utilização do livro em sala de aula, não mais restritos aos livros didáticos. Outros exemplos positivos citados foram os programas para o Ensino Médio, tanto de São Paulo quanto de Goiás, que avançaram ainda mais e permitiram o uso de obras de referência, ampla seleção de romances, contos, livros de divulgação científica e outros. Nesses programas, a característica comum foi a ampla participação dos professores na escolha dos títulos.

Os representantes da CBL lembraram que foi a partir de 1985 com a liberdade de escolha dos professores – característica essencial no PNLD – que as compras de livros feitas pelo Governo Federal saíram das mãos de “comissões de especialistas” e foram transferidas para os mestres. Dessa forma, alguns dos problemas mais sérios dos planos de aquisição de livros por parte do Governo Federal começaram a ser equacionados, particularmente a corrupção.

Outra questão levantada na discussão foi a seleção das obras por um processo de restrição da oferta em nome de uma pretensa centralização, deixando de lado a ampla quantidade de obras oferecidas. De acordo com o Diagnóstico do Mercado Editorial, nos últimos dois anos foram publicados 4.574 títulos classificados como literatura infantil e 4.073 como literatura juvenil, além de 3.190 paradidáticos, todos em primeira edição. Considerando reedições, o total global para dois anos e meio é de 45.152 títulos publicados.

Toda essa riqueza de oferta não foi aproveitada pelo PNBE, que selecionou apenas 30 títulos em sua primeira versão do “Biblioteca em sua Casa” e mais 40 títulos na segunda versão. Ou seja, apenas 0,001% da oferta disponível.

A formatação e a maneira escolhida para a seleção das coleções foram apontadas como motivos para disputas desnecessárias entre autores e editores, quando o importante seria fazer um trabalho juntos aos professores para a escolha dos livros pela sua qualidade e adequação ao trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas.

Para completar, a CBL elogiou a iniciativa do PNBE em ampliar o uso de literatura no ensino básico, assim como o esforço de fazer com que as crianças levem os livros para casa e façam trocas entre si, utilizando-os de várias formas. Sugere também que o cumprimento de prazos e etapas previamente conhecidos, a exemplo do que ocorre com o PNDL, permitiriam a operacionalização correta do programa.

II- Sobre governos e livros – Programas milionários de compras para escolas precisam ser revistos
Luiz Antonio Aguiar, Escritor e diretor da AEI-LIJ, JB Idéias – 02/12

Neste momento, a maior preocupação de todos os segmentos ligados à literatura infantil e juvenil é como vão ser reestruturados os programas de compras oficiais de livros no próximo governo. Não é à toa. Diferente de outros segmentos do mercado, os livros para crianças e jovens, à exceção de fenômenos como Harry Potter, para o qual algumas editoras vêm procurando similares, não têm nas livrarias seu ponto de vendas mais forte. A escola, há décadas, vinha sendo o principal foco do marketing do ramo. No entanto, nos últimos anos e de modo crescente, o governo vem se tornando o maior cliente das editoras. Se por um lado reconhece-se o grande esforço para tornar a literatura mais acessível aos alunos das escolas públicas, há críticas, principalmente, quanto à elaboração dos programas, que deixaram à margem importantes setores envolvidos no processo.

Há muita expectativa de que o novo governo promova uma reformulação dos programas, a começar por ampliar a participação na sua reformatação. Essa é a reivindicação da Associação dos Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil (AEI-LIJ). A AEI-LIJ fala em nome de seus 300 filiados, no país, contando em seus quadros com alguns dos principais e mais premiados escritores e ilustradores brasileiros. Numa carta recente ao presidente eleito, Luís Inácio Lula da Silva, contendo tópicos de uma reflexão sobre o assunto, a Associação defende que os atuais programas de compra de livros sejam mantidos, e para tanto o primeiro passo seria uma ampla discussão sobre os processos decisórios, formato e critérios de seleção dos programas, e sobre o perfil da comissão encarregada de escolher os livros a serem incluídos.

Nos dias 25 e 26 de novembro, em meio às atividades do 4º Salão do Livro para Crianças e Jovens, promovido pela FNLIJ, foi realizado um Seminário centrado na avaliação do PNBE (Programa Nacional da Biblioteca Escolar), sem dúvida a maior estrela das compras governamentais dos últimos dois anos. O PNBE, com o programa Literatura Em Minha Casa, distribuiu cerca de 85 milhões de livros, organizados em coleções de 5 volumes, entre os alunos das 4ª séries de escolas públicas de todo o país. Nunca um programa tão amplo de difusão da literatura foi concretizado no Brasil. Mesmo em âmbito mundial, segundo a FNLIJ, a iniciativa é inédita. Por isso, como demonstrou o seminário, o apoio ao programa é hoje consensual – mas não irrestrito.

Enquanto o propósito desse tipo de programa é dar a esses garotos e garotas a oportunidade — via acesso ao livro — de se tornarem leitores, ou seja, de criarem o gosto pela leitura, e incentivá-los a começar a montar uma biblioteca em casa, aparentemente alguns livros foram escolhidos sem levar em conta a necessidade de cativar o garoto e a garota para a leitura e, alguns casos, nem sequer sua capacidade de compreensão e acompanhamento do texto. Em meio ao debate da AEI-LIJ, o escritor Pedro Bandeira defende que esse problema seria eliminado se a escolha fosse delegada aos professores de cada escola, mais próximos das necessidades de seus alunos, com compras diferenciadas localmente. Já Leo Cunha, também escritor, aponta a necessidade de, entre o professor e o enorme volume de títulos disponível, serem elaboradas listas de pré-seleção, ´´honestas, abrangentes e equilibradas, em termos de autores, editoras, temas, regiões, estilos, gêneros´´. Outros autores levantaram ainda a necessidade de programas que contemplem a liberdade de escolha do próprio leitor, a criança e o jovem, diretamente, sem intermediários, do mesmo modo como qualquer leitor escolhe os livros que vai ler.

Há outras questões surgindo, por exemplo, ´´por que restringir a distribuição de livros à 4ª série? ´´, indaga Henrique Félix, editor da Atual. É a mesma preocupação do presidente da AEI-LIJ, Rogério Andrade Barbosa, que durante o seminário lembrou, como ex-professor, ´´o quanto os alunos das outras séries devem ter se sentido frustrados por não ganharem os livros´´. E os professores e diretores de escola que estão retendo os livros, em vez de distribuírem para os alunos, contrariando o conceito básico do programa? O caso é que os programas de difusão da literatura sempre esbarram numa realidade apontada inclusive pela avaliação feita sobre o assunto pelo TCU: o principal entrave continua sendo a pouca qualificação dos profissionais de ensino para lidar com a literatura na escola.

Considerando estes diversos aspectos, reforça-se a tese de que a revisão dos projetos deve se dar em um fórum amplo, até para que surjam soluções novas para os problemas apontados e reforcem-se engajamentos. Com isso, a possibilidade de que esses programas ganhem efetividade, e mesmo se ampliem, é bem maior. Afinal, como foi lembrado no seminário, o PNBE é um avanço, mas não é um fim em si mesmo. O que precisamos saber é o quanto ele se mostrou adequado ao nosso objetivo maior, o sonho de ver o Brasil se tornar um país de leitores, em que a literatura seja parte de nosso cotidiano e modos culturais.

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