Desafios do novo Ensino Médio

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O Abrelivros em Pauta conversou com Leila Perussolo, secretária de Educação e Desporto de Roraima, vice-presidente e responsável pela Comissão do Ensino Médio do Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED). A Secretária falou sobre os desafios da implementação do novo Ensino Médio, as realidades diversas em cada região, e a adoção dos materiais didáticos. Opinou sobre como o ensino-aprendizagem pode ser mais atrativo para os jovens e como avançar para uma educação igualitária no país. Confira a entrevista do mês:

Abrelivros em Pauta – Quais são as alterações previstas no novo Ensino Médio?

Leila PerussoloAs escolas desenharam seus projetos-pilotos incorporando diretivas aos currículos aprovadas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A fase de teste ajudou a esclarecer que ser o aluno protagonista no aprendizado – premissa do novo Ensino Médio – não significava que ele ditaria o conteúdo. O processo de transição foi fundamental para assimilarmos que os componentes curriculares e objetos, dentro do que prega a BNCC, permaneceriam, só que, agora, numa jornada escolar com duração maior. Neste contexto, a carga horária obrigatória foi ampliada de 800 para 1.000 horas anuais. A reboque veio a alteração para um currículo organizado por áreas do conhecimento e com itinerários formativos fortalecidos. O aluno deixa de ser apenas receptor. Isto trouxe mudanças para a atuação dos professores, das escolas e para a conscientização dos estudantes sobre como os três anos da formação são importantes para a construção de trajetórias para além do período estudantil. O novo Ensino Médio contempla, portanto, soluções para as críticas ao modelo anterior que não possibilitava ao jovem pensar sua vida futura, seja pelo ingresso numa universidade ou por meio de arranjos produtivos locais.

Abrelivros em Pauta – Quais são os principais desafios enfrentados pela Comissão de Ensino Médio?

Leila PerussoloO grande desafio é promover a interlocução dos componentes curriculares por área de conhecimento e conectar com as competências gerais, para que quando o aluno conclua o Ensino Médio ele tenha essa trajetória de construção sólida. Ofertar os itinerários formativos para as quatro áreas do conhecimento implica um número elevado de professores e uma organização diferenciada nas escolas brasileiras. Por isto, nem todas terão condições de introduzir os itinerários uniformemente. Temos trabalhado com a possibilidade da oferta de, no mínimo, dois itinerários. A forma de implementação vai variar em todo o Brasil. Nas regiões em que a escola não conseguir ofertar formação profissionalizante, por exemplo, é possível articular parcerias com intuições locais como Senai, centros profissionalizantes, entre outros. O grande desafio é tornar o aprendizado cada mais atrativo, com foco num projeto de vida futuro e, dessa forma, estimular o estudante a não abandonar a escola.

Abrelivros em Pauta – Como é a composição dos currículos do novo Ensino Médio?

Leila PerussoloO currículo é composto por duas partes: 1.800 horas com os componentes que integram as áreas do conhecimento e 1.200 horas de itinerários formativos. O escopo de 1.800 horas está atrelado à BNCC e foi construído com base no debate público que contou com a participação dos educadores. Já as 1.200 horas, que compõem os itinerários formativos, são livres. Os estados não precisam seguir a mesma configuração. Podem ser ofertadas disciplinas eletivas abertas a partir de um elenco de possibilidades. Não é uma composição amarrada. A organização interna e o planejamento são de cada escola. Esses conteúdos são definidos conforme a realidade dos estados e das escolas. O modelo é adaptável ao contexto regional e às aspirações dos estudantes. Por exemplo, em um munícipio com vocação para agricultura, devido ao potencial do mercado de trabalho local e de uma maior facilidade para o desenvolvimento de parcerias regionais, é possível que itinerários que contemplem atividades relacionadas ao agronegócio interessem mais aos estudantes. Não que seja exclusivo, naturalmente também teremos alunos com interesse em medicina, magistério, veterinária etc.

Abrelivros em Pauta – Qual é o estágio de implementação do novo Ensino Médio?

Leila PerussoloO diagnóstico em março de 2022 apontava que 23 estados estavam com o referencial curricular homologado, um estado em processo de análise e três tinham acabado de enviar os documentos aos respectivos conselhos regionais.
Em virtude do desenvolvimento social, econômico, educacional e da infraestrutura que possuem, os estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Curitiba estão mais avançados na implementação. O grande desafio é, justamente, nivelar todas as regiões do país, levando em consideração os diferentes índices educacionais, as vulnerabilidades e as particularidades locais, além do contingente e da experiência dos docentes em cada localidade. Nossos Grupos de Trabalhos (GTs) visam a promover a troca de experiências entre os estados, tanto dos resultados positivos como negativos. O objetivo é compartilhar exemplos do que funcionou ou não, para auxiliar as localidades em diferentes estágios na implementação. É um verdadeiro aprender fazendo.

Abrelivros em Pauta – Em sua avaliação, quais são as grandes dificuldades de adaptação dos professores ao novo Ensino Médio?

Leila PerussoloA mudança comportamental interna frente ao processo de ensino é o maior entrave. Não basta seguir o que está descrito na lei. Tirá-la do papel requer estar aberto ao novo e não se aprisionar ao método que domina. Ao invés de ministrar conteúdo estanque, o foco passa a ser fornecer ferramental para que o aluno desenvolva projetos de curto, médio e longo prazos. Portanto, é também uma mudança de atitude e de concepção de processos de ensino-aprendizagem. Ou seja, não se trata apenas de currículo escrito, mas também da relação pessoal estabelecida entre aluno e professor. Contudo, é importante destacar que a criação deste ambiente favorável, também depende de as escolas estarem mais bem equipadas e preparadas para que o aluno fique mais tempo no local, com uma alimentação e espaços adequados.

Abrelivros em Pauta – De que forma novos professores serão preparados para lecionar na realidade do novo Ensino Médio?

Leila PerussoloUma das preocupações que levamos para o MEC é de que a formação hoje precisa trazer o conhecimento da área. Ou seja, todos os professores de linguagem, por exemplo, precisam estar dentro do mesmo escopo de formação, respeitando os conhecimentos específicos, o objeto de cada componente curricular, mas promovendo uma formação conjunta.

Abrelivros em Pauta – Qual é o papel do livro didático na configuração do novo Ensino Médio?

Leila PerussoloAs escolas estão recebendo os livros agora, e o grande desafio é integrá-los, uma vez que os professores não tiveram tempo hábil de adaptação aos novos materiais. Os dois anos de pandemia impactaram as atividades planejadas, no âmbito da preparação para o novo Ensino Médio, pelos estados, MEC e CONSED. Tivemos que priorizar, por exemplo, a formação socioemocional dos professores a partir de 2020. Portanto, é grande o desafio de usar materiais por área do conhecimento. A formação dos professores, até hoje, tem sido por disciplina: História, Geografia, Matemática etc. A forma como os novos materiais didáticos foram desenvolvidos exige que o professor discuta o conteúdo com o aluno. O que é bem positivo, mas precisa ser internalizado. A própria forma de avaliar não poderá ser a mesma. A formatação do novo Ensino Médio muda, inclusive, a avaliação no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Devemos, portanto, investir no trabalho articulado do uso do livro didático para podermos realizar a avaliação por área do conhecimento e não fragmentada por componente curricular. Desta forma, teremos condições de mudar a maneira de mensurar o conhecimento dos alunos.

 

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