Por uma efetiva política de Estado para a educação e para o livro

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As políticas públicas voltadas para a distribuição de livros didáticos já existem há mais de 80 anos no Brasil. E em 1996, portanto há 25 anos, houve a efetivação do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), nos moldes em que hoje o conhecemos. Implantou-se no país, a partir daí, uma política de avaliação, compra e distribuição de livros para todos os alunos das escolas públicas brasileiras. Uma iniciativa que também incluiu uma avaliação sistemática e aprimoramento dos livros didáticos. Trata-se de um verdadeiro marco.

Hoje o PNLD é simplesmente um dos maiores programas educacionais públicos do mundo. Pelos Correios, todos os anos milhões de livros chegam a milhares de pontos em todo o Brasil: de escolas públicas de educação básica das redes federal, estaduais, municipais e distrital a instituições de educação infantil. Milhões de alunos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio são beneficiados.

Os materiais e livros didáticos são selecionados pelo Ministério da Educação mais precisamente pela Secretaria Os materiais e livros didáticos são selecionados pelo Ministério da Educação, mais precisamente pela Secretaria de Educação Básica. E a compra e a distribuição ficam a cargo do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, o FNDE, uma autarquia vinculada ao MEC.

Para se ter uma ideia, em 2021 foram distribuídos, até o início de novembro, quase 137 milhões de exemplares de livros didáticos a 29 milhões de alunos de mais de 226 mil escolas de todo o Brasil. Para garantir esta política pública, o FNDE investiu quase R$ 1,2 bilhão no período.

Mas se a maior crise sanitária em mais de um século não impediu a execução de um programa desta magnitude –e que ganhou ainda mais importância com o isolamento social por conta da pandemia –, uma questão nacional trouxe instabilidade em 2021: a dificuldade em se compor o orçamento federal.

Os recursos do FNDE vêm de fontes diversas. Mas como gastos com educação, como o do PNLD, não são despesas obrigatórias, o MEC não tem a garantia de recebimento de todos os recursos – na totalidade e/ou no prazo necessários.

O descompasso no orçamento atingiu os recebimentos do MEC e, por extensão, as encomendas do FNDE, levando a compras parciais de livros que só ao final do ano estão sendo regularizadas.

A instabilidade aconteceu, porém, justamente às vésperas da entrada em vigor em 2022 do Novo Ensino Médio. Materiais de transição não puderam ser adquiridos para uso de alunos e professores neste segundo semestre, prejudicando uma etapa importante antes da entrada em vigor de uma das maiores reformas educacionais do Brasil nas últimas décadas. Acabaram sendo parcialmente adquiridos para uso em 2022.

Só foi possível contemplar esta reforma, aliás, porque o Brasil conta com uma indústria editorial capaz de atendera um desafio desta magnitude. E que, nos últimos anos, aprimorou ainda mais seus conteúdos.

As mudanças implantadas alteraram o próprio conceito do livro didático. Não se pode mais falar em um produto somente físico, mas sim em um conteúdo que pode ser adaptado a diversos tipos de plataformas tecnológicas, como tanto exigem os tempos atuais.

Mas seja impresso ou digital, o livro envolve um processo de produção pedagógica editorial de excelência, com a dedicação de autores, equipes altamente qualificadas e um imenso trabalho de curadoria, grandes exigências de ordem administrativa – um livro pode exigir a assinatura de até 600 contratos – e uma operação logística altamente complexa. E qualquer descompasso no programa do PNLD, por questões orçamentárias, tem um impacto negativo imediato.

Bastaria a combinação de tantos desafios, entre a encomenda do livro didático até sua entrega nas mãos de alunos e professores, para recomendar que uma política pública de tal importância não fosse submetida ao resultado dos entendimentos entre o Executivo e o Legislativo federais em torno do Orçamento da União.

Hoje os gastos com o PNLD não estão como despesas obrigatórias no orçamento do ministério da Educação – aquelas despesas que não podem deixar de ser feitas, por determinação constitucional ou legal. Entre as obrigatórias, no orçamento federal, estão listadas, por exemplo, transferências dos fundos de participação de estados e municípios, despesas de pessoal e encargos sociais, seguro-desemprego e débitos judiciais. Ou seja, o fluxo de recursos para a aquisição de livros escolares – nem sempre se encontra 100% garantido. E, como ocorreu em 2021, isto pode levar a uma instabilidade no PNLD.

Uma solução seria a educação passar a ser tratada como uma efetiva política de Estado, amparada pela Constituição.

O certo é que determinadas políticas públicas, como a executada através do PNLD, devem ser cumpridas, independentemente dos rumos do orçamento federal ou mesmo de decisões de governos. Ou seja, despesas em educação como o PNLD (e por consequência, o livro) deveriam ser efetivamente enquadradas como política de Estado, e suas despesas determinadas como obrigatórias.

Isto também evitaria sobressaltos como o trazido pelo PL 3887, da reforma tributária apresentada pelo ministério da Economia em julho de 2020. A proposta ainda está em tramitação no Congresso Nacional. E se for aprovada resultará no fim da imunidade tributária do livro, uma conquista iniciada há quase 80 anos.

Com o aumento nos preços de todas as obras, estimado em 20%, haveria maior dificuldade de acesso da população à educação e à cultura. E cresceria a despesa do maior comprador de livros do mercado nacional, o Governo Federal. Ou seja, mais um fator de preocupação quando os problemas de orçamento já são evidentes.

A educação é imprescindível para o Brasil mais justo e mais desenvolvido que todos almejamos. E só como uma efetiva política de Estado protegendo programas como o PNLD será valorizada e estará fortalecida para este papel.

*Ângelo Xavier, presidente da Associação Brasileira de Editores e Produtores de Conteúdo e Tecnologia Educacional (Abrelivros)

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